SL - 34 POLÍTICA URBANA E GEOGRAFIA DOS RISCOS: VULNERABILIDADE E POLÍTICAS DE ADAPTAÇÃO ÀS MUDANÇAS AMBIENTAIS

  • Eduardo Marandola Jr.
  • Laura Machado de Mello Bueno
  • Julien Rebotier
  • Gabriela de La Mora
  • Douglas Sathler
  • Lutiane Queiroz de Almeida
Palavras-chave: política urbana, mudança climática, riscos ambientais urbanos, políticas públicas, planejamento urbano e regional

Resumo

Um dos desafios atuais da política urbana em termos de planejamento urbano e regional e de respostas são os impactos colocados pelas mudanças ambientais globais, e suas repercussões regionais e locais, já sentidas ou projetadas para os próximos anos, as quais redesenham a discussão sobre a sustentabilidade neste início de século.
Em primeiro lugar, é importante situar a questão, já que mudanças climáticas se tornou um algo como um mantra acadêmico e político, que parece ser inescapável. O que vivemos desde 2007 (já há cinco anos, portanto) é a constituição das mudanças climáticas como o tema predominante e mobilizador de todo esforço ambientalista, seja na academia ou fora dela, ocupando a posição que em outras épocas já foi do desmatamento, do buraco na camada de ozônio, da poluição industrial, dos agrotóxicos na agricultura, etc. Visto por este ângulo, mudança climática não é propriamente uma questão nova, especialmente quando pensamos nas dimensões humanas e suas implicações para a sustentabilidade, mas é o carro-chefe ou o contexto prioritário das ações que envolvem toda a discussão ambiental.
Como tal, reclama um tratamento interdisciplinar, já que é em si complexa e multifacetada, o que torna imprescindível seu tratamento pelo conjunto de olhares e métodos diferentes, especialmente no contexto do planejamento urbano e regional, que envolve a articulação de escalas e setores diferentes da gestão e produção do espaço.
É neste contexto que é fundamental a ideia de risco (e mais recentemente, vulnerabilidade), como noção mobilizadora deste esforço de compreensão. Risco é uma noção que foi introduzida no debate ambiental há bastante tempo, ajudando geógrafos, engenheiros ou estudiosos da saúde a identificar fatores causadores de agravos, ou áreas sujeitas a deslizamentos, inundações e outros perigos ambientais e suas respectivas populações afetadas. No entanto, desde que houve a releitura da ideia de risco, como parte integrante do próprio mecanismo de reprodução social das sociedades contemporâneas (nos anos 1990 com mais força), este termo tem sido fundamental para entender a questão ambiental de um ponto de vista dos desastres, dos danos e das ameaças que uma determinada forma de relação sociedade-natureza gera resultados imprevistos, ampliando a questão do planejamento para além de suas escalas diretas de ação.
A discussão das mudanças climáticas, com seu caráter cataclísmico e seu alcance mundial, leva esta discussão ao extremo, colocando em cheque o sistema global atual, seu modelo de política, planejamento, produção e consumo e sua lógica baseada na desigualdade e na produção e distribuição de riscos intrinsecamente. Mas junto com a difusão da preocupação com as mudanças climáticas vieram também as propostas de enfrentamento, um pacote que envolve duas faces: mitigação e adaptação.
A primeira se refere a paliativos, a ajustes de conduta ou de eficiência de processos para diminuir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) ou implementando capacidades de resposta em áreas e populações em risco. A segunda envolve a revisão de modelos de desenvolvimento e planejamento, substituição de tecnologias e de processos (cadeias produtivas inteiras, se for o caso), visando alterar a relação sociedade-ambiente na sua base. As primeiras têm sido preferidas em relação às segundas, pois despendem menos recursos e não implicam em mudanças substanciais no status quo.
Estas propostas têm sido feitas bastante unilateralmente, na forma de pacotes e diretrizes que, no mínimo, ignoram que os Estados, as regiões e os lugares têm especificidades e sua própria agenda de prioridades. De outro lado, ações apenas mitigadoras têm sua eficácia fortemente questionada em garantir a sustentabilidade.
É preciso, portanto, problematizar como estas agendas de planejamento têm sido construídas, problematizando as prioridades dos países vis-à-vis as atuais políticas que têm sido implementadas ou construídas, as quais têm priorizando sobretudo a mitigação versus a adaptação.
A questão é premente por uma série de motivos. Em primeiro lugar, para além da imposição desta agenda, no âmbito mundial, para os governos nacionais e os governos urbanos, as cidades ainda não possuem diagnósticos precisos sobre o alcance e a dimensão das mudanças e sobretudo como estas atingirão as cidades, em cada contexto específico. Em segundo lugar, a partir dos acordos internacionais e da promulgação de planos nacionais de enfrentamento e gestão dos riscos ligados à mudança climática, um processo de elaboração de políticas de enfrentamento nos níveis hierárquicos inferiores se dá até atingir as cidades, chegando rapidamente à escalas onde não há, ainda, uma incorporação dos impactos e consequências destas discussões, tornando imprescindível compreender esta escala de ação política e intervenção de planejamento. Em terceiro lugar, diferente do que a agenda internacional coloca para o Brasil, nossa principal preocupação com respeito às mudanças climáticas e à adaptação não é no controle do desmatamento da floresta Amazônica, mas está no enfrentamento dos desastres e riscos urbanos, que possuem raízes históricas para além das mudanças ambientais globais recentes, mas que ganham novos contornos a partir delas. O mesmo pode ser dito para outros países, que precisam, cada qual, avaliar sua própria geografia dos riscos para priorizar, em termos de políticas, aqueles que são mais prementes em seu território.
Neste contexto, a discussão que se impõe é a da interface entre processos globais de construção e distribuição social do risco, as formas como este se constituiu enquanto problemáticas pautadas pelas agências internacionais e órgãos multilaterais, a partir dos quais se torna políticas nacionais e, por fim, chega na elaboração mais orgânica, onde se dá o planejamento e o enfrentamento de perigos concretos que afetam todo ordenamento territorial e o devir urbano. As mediações pelas quais passa tal processo e os lapsos e descontinuidades na discussão produzem efeitos diversos no nível do planejamento e das políticas urbanas, que podem tornar as ações completamente ineficazes para dar respostas aos desafios para as cidades.
Esta sessão livre objetiva colocar tais questões em discussão, a partir da colaboração entre pesquisadores brasileiros e estrangeiros (ligados ou não à Rede Brasileira de Pesquisa em Mudanças Climáticas – RedeClima, subrede Cidades), os quais têm acompanhado diferentes faces deste processo a partir de perspectivas disciplinares e interdisciplinares específicas e dos contextos socioespaciais e políticos da construção e do enfrentamento desta problemática. O contexto brasileiro, mexicano e francês, discutidos em conjunto, fornecem um quadro rico para refletir sobre os desafios a serem enfrentados pelos governos urbanos contemporâneos frente às ainda presentes questões sobre o desenvolvimento e o planejamento urbano regional e a atual necessidade de dar resposta aos riscos oriundos das mudanças ambientais que demandam a elaboração e implementação de políticas de adaptação nas cidades.

Publicado
2018-10-17
Seção
Sessão Livre