SL44 Novas demandas, contradições e conflitos urbanos:
desafios para o planejamento e a gestão urbana no século XXI
Resumo
SL-44. Novas demandas, contradições e conflitos urbanos: desafios para o planejamento e a gestão urbana no século XXI
Coordenadora: Linda Maria de Pontes Gondim (UFC)
Resumo:
A sessão tem como núcleo temático os desafios colocados para o planejamento e a gestão urbanos contemporâneos. As pesquisas incluídas contemplam diferentes cidades, abordando problemas que, se não são recentes, têm se agravado nas duas primeiras décadas do século XXI, desafiando as políticas públicas e os modelos de gestão elaborados para solucioná-los. O insucesso dessas intervenções revela-se na persistência dos déficits quantitativos e qualitativos da oferta de bens e serviços essenciais à urbanidade. A crise econômica global de 2008 não apenas exacerba esses déficits, como revela as fragilidades do modelo econômico mundial. No caso brasileiro, não seria de se esperar que esses déficits, que remontam às primeiras décadas do século XX, pudessem ser superados num período relativamente curto de tempo. O mais preocupante, porém, é que os problemas urbanos têm sido agravados, em grande parte, por políticas públicas exitosas no combate à pobreza e às desigualdades sociais. Com efeito, o projeto socioeconômico iniciado pelo presidente Lula e continuado por sua sucessora, Dilma Rousseff, promoveu significativas melhorias nas condições de vida da população de baixa renda, por meio de políticas e programas como o Bolsa-Família, o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar, aumento do salário-mínimo a níveis mais altos que a inflação e crescimento do emprego formal, entre outros. Para fazer frente à crise mundial de 2008, foram implementados o Programa de Aceleração do Crescimento e o Minha Casa, Minha Vida, que serviram para “aquecer” a economia, favorecendo os setores imobiliário e da construção civil. Apesar dos efeitos positivos dos programas sociais, essa opção por um modelo de desenvolvimento baseado em grandes obras tem tido consequências negativas para as cidades. O financiamento massivo para a produção de imóveis piorou a desordenada ocupação do espaço urbano, expulsando grande parte da população pobre para periferias sem condições adequadas de urbanização. Os incentivos ao transporte individual e o descaso para com o transporte público aumentaram os congestionamentos, o tempo e o custo dos deslocamentos. Não por acaso, o estopim das manifestações de junho de 2013 foi o aumento das tarifas de transporte coletivo em São Paulo e outras cidades. Convocados por meio das redes sociais, os protestos assumiram dimensão massiva e incorporaram pautas diversificadas, como demanda por educação e saúde de qualidade, rejeição a obras relacionadas a grandes eventos esportivos, como a Copa das Confederações de 2013 e a Copa do Mundo de 2014 (reformas ou construção de novos estádios, viadutos e infraestrutura para meios de transporte de massa, como o VLT), as quais ocasionaram remoções de comunidades de baixa renda, supostamente necessárias para projetos de mobilidade urbana. Os estádios ficaram prontos e a Copa de 2014 foi considerada “um sucesso” pela mídia e pelo governo. Contudo, os projetos de mobilidade urbana permanecem inconclusos, as ameaças de expulsão de comunidades de baixa renda continuam e a questão urbana torna-se cada vez mais grave, evidenciando as contradições do modelo socioeconômico e político. Tendo o contexto da crise global de 2008 e as manifestações populares de 2013 e suas especificidades locais como pano de fundo, os trabalhos a serem apresentados nesta sessão visam discutir as contradições e os conflitos gerados em diferentes cidades em setores essenciais para qualidade de vida urbana, tais como, habitação, transporte público, segurança pública, gestão de resíduos sólidos, gestão de água e preservação ambiental. O primeiro trabalho – A QUESTÃO URBANA E AS JORNADAS DE JUNHO DE 2013 – de autoria de Linda Gondim, apresenta o contexto geral que pauta a discussão e enquadra os trabalhos desta sessão. Nele, a autora analisa os protestos populares ocorridos em 2013 em várias cidades brasileiras, contra o aumento das tarifas de transporte coletivos e incorporando outros temas e demandas, mas tendo como eixo central os principais problemas das cidades brasileiras. Reconhecendo os ganhos sociais obtidos durante os doze anos de gestão federal do PT, a autora argumenta, no entanto, que o modelo desenvolvimentista adotado pelos governos Lula e Dilma Rousseff tem agravado os problemas urbanos do país. Em seguida, Rachel Coutinho apresenta o trabalho NOVOS CONFLITOS, NOVAS DEMANDAS E VELHOS PROBLEMAS URBANOS NAS FAVELAS CARIOCAS OCUPADAS PELAS UPPS, que analisa o impacto do programa estadual de pacificação de favelas cariocas – a Unidade de Polícia Pacificadora. A autora mostra que as UPPs vem reconfigurando e melhorando o ambiente econômico das comunidades informais, sem contudo resolver os velhos problemas urbanos existentes nas favelas, gerando assim novos conflitos e demandas por parte dos residentes nessas áreas. O terceiro trabalho, de autoria de Lucia Cony e Marilia Peluso – URBANIZAÇÃO, MEIO AMBIENTE E RESÍDUOS SÓLIDOS: GESTÃO E CONFLITOS NA REGIÃO INTEGRADA DE DESENVOLVIMENTO DO DISTRITO FEDERAL E ENTORNO (RIDE-DF) – explora os conflitos que surgem na gestão dos resíduos sólidos no Distrito Federal e entorno, a partir do aumento na produção de lixo gerado como resultado do aumento da renda e do consumo em todas as classes sociais. Argumentam que as ações intermunicipais neste setor tem sido insuficientes, gerando conflitos sociais e impactos ambientais. O quarto trabalho, de Angélica T. B. Alvim, URBANIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL: CONFLITOS E DESAFIOS PARA AS ÁREAS DE MANANCIAIS DA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO, aborda um outro aspecto importante e conflituoso, que vem causando sérios problemas socioambientais nas cidades brasileiras: a gestão de mananciais com invasões e assentamentos precários, tendo como exemplo as áreas de mananciais na Região Metropolitana de São Paulo. Analisa as contradições existentes entre as políticas ambientais e as urbanas, que contribuem para acirrar os conflitos entre a preservação ambiental e o direito à moradia. Finalmente, o trabalho de David Amborski, A CRISE DA MORADIA A PREÇOS ACESSÍVEIS NA REGIÃO METROPOLITANA DE TORONTO, CANADÁ, apresenta um contraponto internacional para aprofundar o debate proposto nesta sessão, qual seja, o de apresentar os desafios impostos ao planejamento e à gestão urbanos a partir das contradições do modelo econômico global com seus rebatimentos e especificidades locais. Desta forma, o autor discute a produção de habitação convencional e social na região metropolitana de Toronto (RMT), a partir da crise econômica global de 2008. Argumenta que, apesar da crise, os preços dos imóveis na RMT não arrefeceram, o que dificulta o acesso à moradia por grande parte da população, seja de classe média, seja de baixa renda. Uma razão disto é a nova demanda de investimentos em imóveis para fins de aluguel. Esse fenômeno está ocorrendo em menor escala, mas de forma igualmente preocupante, nos mercados imobiliários das grandes cidades brasileiras, nos quais se observa uma alta no preço dos imóveis, com limitações ao acesso à moradia a preços acessíveis para grande parte das populações urbanas.
Exposição: A questão urbana e as jornadas de junho de 2013
Expositora: Linda Maria de Pontes Gondim (UFC)
Resumo: A pesquisa discute os protestos ocorridos nas cidades brasileiras em junho de 2013, situando-os na conjuntura política marcada pela hegemonia do Partido dos Trabalhadores (PT). Tais protestos, como outros movimentos sociais na era da globalização, repudiavam as formas institucionalizadas de representação política (partidos, sindicatos, parlamentos), não contavam com centros organizacionais e tinham a internet como principal mecanismo de articulação. Deve-se destacar a heterogeneidade dos participantes e a multiplicidade de pautas: por melhores serviços de educação, saúde e transporte, contra a corrupção, repúdio a grandes obras relacionadas com a Copa das Confederações e a Copa do Mundo, entre outras. A questão da mobilidade urbana foi central, particularmente o aumento do preço das passagens de transporte coletivo. Argumenta-se que grande parte dessas pautas estão associadas ao modelo de desenvolvimento socioeconômico dos governos de Lula e Dilma Rousseff. Os investimentos em grandes obras e em programas para o crescimento econômico, como o PAC e o Minha Casa, Minha Vida, combinados com os incentivos tributários para a aquisição de automóveis, acarretaram expansão urbana desordenada e a acentuaram o grave problema da mobilidade urbana.
Exposição: Novos conflitos, novas demandas e velhos problemas urbanos nas favelas cariocas ocupadas pelas UPPs
Expositor: Rachel Coutinho Marques da Silva (UFRJ)
Resumo: O Governo do Estado do Rio de Janeiro vêm implantando desde 2008 um ambicioso programa de segurança pública em algumas favelas cariocas intitulado Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), que visa recuperar os territórios dominados pelo narcotráfico nas favelas, estabelecendo um programa de pacificação e reconstrução institucional aliado à obras de infraestrutura e implantação de serviços e equipamentos públicos. Nas comunidades nas quais a UPP foi implantada há mais tempo, observam-se novas dinâmicas urbanas intra-favelas, tais como novos investimentos comerciais e de serviços, expansão do mercado imobiliário informal e da construção civil, crescimento da atividade turística, de lazer e desportiva, propiciando a geração de novos empregos e aumento da renda familiar. Se, por um lado, as novas dinâmicas socioeconômicas reconfiguram fortemente essas favelas, por outro, a ausência de uma ação urbanística coordenada para os vários projetos em curso, aliada à precariedade da infraestrutura básica e da habitação, e à presença ostensiva da PM com seus métodos arcaicos e violentos de policiamento, aumentam os fatores de risco e vulnerabilidade socioambiental. A UPP gera expectativas de melhoria de segurança pública e de infraestrutura em uma população com mais renda, que demanda agora uma ação efetiva e eficaz do Estado. Na medida em que estas demandas não conseguem ser atendidas, surgem novos conflitos e resistências no interior das comunidades. O objetivo deste trabalho é analisar os ganhos e os prejuízos decorrentes da implantação da UPP, tendo como estudo de caso a UPP do Complexo do Alemão e a UPP do Pavão-Pavãozinho-Cantagalo.
Exposição: Urbanização, meio ambiente e resíduos sólidos: gestão e conflitos na região integrada de desenvolvimento do distrito federal e entorno – RIDE-DF
Expositoras: Lucia Cony Faria Cidade (UnB), Marília Luiza Peluso (UnB)
Resumo: Apesar de nem sempre devidamente lembrado, o histórico de regiões metropolitanas explicita os inúmeros problemas gerados por grandes aglomerações, e revela as dificuldades e disputas que caracterizam o planejamento e a articulação política. Tensões na gestão compartilhada daqueles considerados serviços públicos comuns revelam-se particularmente intensas no caso da coleta e disposição final de resíduos sólidos. Enquanto o modelo de desenvolvimento da sociedade de risco incentiva a produção e o consumo de quantidades crescentes de bens, as práticas para seu descarte, reaproveitamento ou possível reintegração sistêmica tendem a criar novos problemas. Em metrópoles de países não centrais, as dificuldades se multiplicam. Em larga medida dependente de atividades terciárias, a dinâmica urbana de Brasília, o Distrito Federal, alcança com intensidades variáveis outras cidades da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – RIDE-DF. Ao lado da expansão urbana de Brasília, municípios da RIDE também têm registrado expressivo crescimento e pressões sobre o quadro natural. Elevados níveis de renda na capital, associados a avanços econômicos e sociais recentes, têm ocasionado não apenas um aumento nos níveis de consumo, mas também seu corolário, a produção de resíduos de todos os tipos. Assim, o objetivo do trabalho é explorar tensões que envolvem urbanização, ambiente e gestão de resíduos sólidos no âmbito da RIDE-DF. Visando a enfrentar problemas com ramificações intermunicipais, governos têm promovido iniciativas conjuntas. No caso do lixo, as ações parecem ter sido insuficientes ou ineficazes, gerando conflitos que envolvem a população e o território e ocasionado sérios problemas ambientais.
Exposição: Urbanização e preservação ambiental: conflitos e desafios para as áreas de mananciais da região metropolitana de São Paulo
Expositora: Angélica Tanus Benatti Alvim (Mackenzie)
Resumo: O debate sobre a escassez da água não é recente. Insere-se no amplo debate sobre os conflitos entre urbanização e preservação ambiental. Se por um lado, a escassez da água tende a ser mais severa no futuro, por outro, a escassez e o preço do solo em áreas propícias à urbanização, aliados à ausência de políticas públicas de habitação e de infraestrutura, acabam por induzir a ocupação irregular, contribuindo para acirrar os conflitos entre a preservação ambiental e o direito à moradia. Nas áreas de mananciais da Região Metropolitana de São Paulo, os desafios para preservação das águas são significativos, sobretudo porque as políticas ambientais e urbanas se confrontam com processos de ocupação precários das áreas protegidas. Considerando os desafios impostos pelo confronto entre demanda de habitação e a necessidade de preservação da água, enquanto recurso natural limitado, e sobre perspectivas de integração e defasagens entre políticas urbanas e ambientais em áreas protegidas, interessa discutir: O que é preservar, para a política urbana? Quais seriam os padrões de urbanização e usos considerados adequados para a política ambiental? É possível estabelecer consenso entre políticas cujos objetivos, desafios e prioridades se apresentam muitas vezes em confronto? Como aproximar e negociar possibilidades de gestão do território capazes de acomodar os interesses conflitantes das políticas urbanas e ambientais, se as primeiras enfrentam o desafio de equacionar o ordenamento territorial, e a segunda tem busca preservar e recuperar os recursos naturais?
Exposição: A crise da moradia a preços acessíveis na região metropolitana de Toronto, Canadá
Expositor: David Amborski (Ryerson University)
Resumo: O mercado imobiliário na região metropolitana de Toronto (RMT) apresentou aumentos consideráveis de preços na última década. Apesar da recessão que afetou os mercados imobiliários globais, a cidade de Toronto manteve o patamar de preço de seus imóveis. Atualmente, são construídas em Toronto anualmente 15.000 unidades habitacionais (U.H.s) em condomínio. Na faixa da habitação social, observa-se que os recursos são bem limitados, tanto na produção de novas unidades como na manutenção das existentes. A TCHC – Empresa de Habitação Comunitária de Toronto – estima um déficit de CAD$800 milhões para manter suas 135.000 unidades. A questão da habitação a preços acessíveis existe tanto no âmbito do mercado imobiliário convencional, quanto no da habitação social (para a construção
de novas unidades ou para a manutenção das existentes). Este mercado é influenciado tanto pelo alto custo de produzir novas unidades, quanto pela demanda dos investidores por imóveis para fins de aluguel, principalmente do tipo condominial. Um estudo de 2012 identificou um custo de CAD$67.252,00 (impostos e outras taxas) para construir novos condomínios em Toronto, sendo este o mais barato em todos os municípios integrantes da RMT, porém um importante impedimento para a construção de unidades a preços acessíveis. Esse problema atinge todos os segmentos imobiliários, o convencional e o da habitação social e buscam-se soluções nos níveis de governo, ONGs e na Empresa Canadense de Crédito Imobiliário. O objetivo deste trabalho é apresentar e refletir sobre as várias soluções que estão sendo consideradas para resolver essa questão.