SL20 Cultura, Arquitetura e Cidade na América Latina: questões para o desenvolvimento em perspectiva histórica, 1930-1980

  • Eulalia Portela Negrelos
  • Rodrigo de Faria
  • Nilce Aravecchia Botas
  • Camila Ferrari
  • José Carlos Huapaya Espinoza
  • Elisangela de Almeida Chiquito
Palavras-chave: urbanismo, planejamento metropolitano, PLAMBEL, América do Sul, John Turner, cidade popular, urbanização, desenvolvimento

Resumo

Cultura, Arquitetura e Cidade na América Latina: questões para o desenvolvimento em perspectiva histórica, 1930-1980

Culture, Architecture and City in Latin America: issues for development in historical perspective, 1930-1980

Coordenadora: Eulalia Portela Negrelos, IAU-USP – Instituto de Arquitetura e Urbanismo – Universidade de São Paulo, Docente e pesquisadora, negrelos@sc.usp.br

Debatedor: Rodrigo de Faria, FAU-UnB – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – Universidade de Brasilia, Docente e pesquisador, rod.dfaria@gmail.com

O  XVII ENANPUR indica a discussão sobre o desenvolvimento, num quadro de crise econômica e social internacional, propondo a reflexão sobre formas de resistência no campo do planejamento urbano e regional. XVII ENANPUR indica a discussão sobre o desenvolvimento, num quadro de crise econômica e social internacional, propondo a reflexão sobre formas de resistência no campo do planejamento urbano e regional. Partimos da compreensão de que na primeira década do século XXI se estabelece uma ideologia do “neo” ou “novo” desenvolvimentismo (MARICATO, 2003; BRESSER; THEUER, 2012), entendido na forma como o XVII Encontro da ANPUR o localiza na proposta temática geral, como a

retomada do crescimento econômico... com políticas de desenvolvimento, criação de novas políticas de transferência de renda, e a retomada de investimentos em infraestrutura e habitação... avanços na redução da pobreza e da desigualdade... fomentando impactos com alguma relevância no desenvolvimento urbano e regional.

Duas perguntas são feitas na reflexão temática inicial: a primeira, sobre as razões das dificuldades de estabelecer o desenvolvimento econômico com inclusão social e de fazer prosperar uma agenda de desenvolvimento urbano e regional.Considerando a crise internacional com a instalação de recessão que tem levado à revisão dos investimentos públicos vinculados à inclusão social, a outra pergunta, mais normativa, se encontra no âmbito das potencialidades e da ação política para evitar “o recuo da agenda de reformas urbanas e regionais”, agenda essa que o próprio texto inicial do XVII ENANPUR já admite que “pouco avançou”.

No Brasil, e também nos demais países da América Latina, admite-se a emergência de movimentos sociais em reação ao atual período recessivo e também às respostas que as políticas econômicas têm oferecido. Com a crise econômica, a disputa entre setores sociais díspares, até então apaziguadas por um período de crescimento, vem produzindo novos movimentos posicionados em confronto: uns com forte caráter contestatário - que, inclusive têm sido considerados "insurgentes" -, que pressionam pelo aprofundamento de reformas que signifiquem distribuição de renda; e outros de viés mais conservador, com base de massa nas classes médias urbanas, por se sentirem ameaçadas pelos ganhos recentes das faixas mais pobres da população.

Propõe-se olhar os acontecimentos pretéritos, buscando os vínculos entre as ações estatais sobre a economia e sobre o território, e a movimentação social em função dessas ações, correlacionando-os à trajetória do pensamento desenvolvimentista. Estima-se que essa reflexão possa nos auxiliar a construir uma crítica mais complexa e pertinente ao pensamento desenvolvimentista no âmbito dos contextos específicos ao longo do processo histórico, buscando iluminar tanto suas fragilidades quanto seus potenciais no que tange à questão urbana.

Para tanto, esta Sessão Livre reúne os resultados parciais das investigações no âmbito do Grupo de Pesquisa Cultura, Arquitetura e Cidade na América Latina, lançando-se ao desafio teóricometodológico e político proposto pelo tema do XVII ENANPUR, colocando alguns componentes do desenvolvimento brasileiro e latino-americano em perspectiva histórica. O recorte temporal proposto corresponde à periodização apresentada por autores que se debruçaram sobre a história do pensamento econômico no Brasil, definindo um “primeiro ciclo ideológico do desenvolvimentismo” localizado entre 1930 e 1964, e o esgotamento da hegemonia desse pensamento num segundo ciclo entre 1964 e 1980 (esse último, correspondente à modernização conservadora empreendida pelo governo militar). (Bielschowsky, 2000; Bielschowsky e Mussi, 2005; Pochmann, 2015).

Segundo Bielschowsky (2000), de 1956 a 1960 (não por acaso, ano da inauguração de Brasília) o Brasil conheceu o apogeu do desenvolvimentismo e, durante o período seguinte (de 1961 a 1964), dá-se sua crise, justamente nos anos de governo de João Goulart, que vinha estruturando reformas de base. Essas reformas, apesar de não incluir no documento “Plano Trienal” as questões urbanas, representaram um conjunto de propostas de mudança social ou “reformismo institucional” (FURTADO, 1977, 12) que constituiriam, segundo este autor, “circunstâncias favoráveis” (p. 18) para, junto a outros elementos de análise, justificar o golpe militar de 1964 contra um suposto avanço comunista. á-se sua crise, justamente nos anos de governo de João Goulart, que vinha estruturando reformas de base. Essas reformas, apesar de não incluir no documento “Plano Trienal” as questões urbanas, representaram um conjunto de propostas de mudança social ou “reformismo institucional” (FURTADO, 1977, 12) que constituiriam, segundo este autor, “circunstâncias favoráveis” (p. 18) para, junto a outros elementos de análise, justificar o golpe militar de 1964 contra um suposto avanço comunista.

Depois de uma aposta do governo militar numa ação intervencionista baseada nas ideias desenvolvimentistas, atravessamos outro período de questionamento do modelo a partir da crise internacional do petróleo de 1973. No Brasil, seus efeitos tomaram vulto pouco a pouco, esboroando o chamado “milagre econômico”, resultado de medidas autoritárias de uma modernização excludente que não logrou as transformações sociais previstas por um segmento do pensamento desenvolvimentista. Tal crise atinge seu ápice em 1980, sendo o último governo militar um período de descenso do capitalismo e do ciclo da industrialização no Brasil, caracterizado pela queda da burguesia industrial e esvaziamento do protagonismo econômico do estado de São Paulo. (POCHMANN, 2015)

Com maior ou menor grau de aproximação, esses "ciclos ideológicos" do desenvolvimentismo ocorreram nos outros países da América Latina, sobretudo pelo protagonismo que a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), com o pensamento de seus economistas, exerceu sobre os governos no continente. Da mesma maneira, esses países também assistiram à organização de inúmeros movimentos sociais, que elaboraram diversas formas de apoio ou de contestação aos princípios desenvolvimentistas, seja pelos limites, seja pelos ganhos sociais que o alcance desse pensamento representou. As resistências, que o XVII ENANPUR evoca, ocorrem historicamente, tanto no primeiro ciclo - movimentos vinculados à manutenção de elementos de um projeto nacional com a inclusão das massas urbanas -, quanto no segundo ciclo ideológico do desenvolvimentismo - movimentos sociais vinculados à redemocratização, incluindo ação direta de resistência guerrilheira e o adensamento dos movimentos sociais urbanos baseados na luta pelo espaço da cidade produzido na forma da “espoliação urbana”, compreendida nos termos de Kowarick (1979).

O quadro do Planejamento Urbano e Regional, no período delimitado por esta Sessão Livre, no que tange ao universo nacional, inclui desde as ações dos planos nacionais de desenvolvimento ao longo da chamada “Era Vargas” (1930-1964) passando pelas ações do SERFHAU (de 1964 a 1975), articuladas ao discurso das produções urbana e habitacional integradas, e também as demais ações do regime militar sobre as questões habitacional e urbana. (BIELSCHOWSKY, 2004; BIELSCHOWSKY, 2011). No que diz respeito à América Latina, esse arco temporal abrange desde uma ação estatal mais centralizada (em que houve uma adoção mais ou menos hegemônica de planos globais e promoção de conjuntos habitacionais que seguiram os preceitos do movimento moderno), até as propostas de planejamento participativo (que inclui dinâmicas mais democráticas no agenciamento do território e a participação dos usuários no projeto e na realização de conjuntos habitacionais de caráter social). Compreender o percurso da formulação de planos nacionais de desenvolvimento é fundamental para enfrentar os desafios atuais do desenvolvimento nacional, tendo como um dos mais estruturais a questão da recorrente superação pelos governos que se sucedem, sem que se possa finalizar a implantação das metas pretendidas; outra questão na formulação de planos nacionais encontra-se nas dificuldades de se fazerem aprovar no Congresso Nacional e, quando o são, de se fazerem efetivar nas instâncias federativas envolvidas.

Palavras-chave: desenvolvimento, Brasil, América Latina.

CIUDAD KENNEDY: POLÍTICA, URBANIZAÇÃO E DEPENDÊNCIA EM BOGOTÁ

Nilce Aravecchia Botas, FAU-USP - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – Universidade de São Paulo

Ciudad Kennedy é um bairro de Bogotá, localizado na porção sudoeste da capital colombiana, onde estão fixados os setores de menor renda da população, que teve origem no conjunto habitacional de mesmo nome, construído entre 1961 e 1963. Contando com recursos do programa Aliança para o Progresso promovido pelos EUA, o conjunto exemplifica as mudanças de paradigma do campo disciplinar da arquitetura e do urbanismo, que vai relativizando os preceitos modernistas de conjuntos habitacionais concebidos pela autoridade do arquiteto para dar lugar a propostas que incluem a participação dos usuários na concepção dos projetos e nos processos de produção das moradias. A implantação de Ciudad Kennedy ocorreu durante o período da chamada "Frente Nacional" - pacto firmado entre liberais e conservadores que, entre 1958 e 1974, pautou a alternância de poder entre os dois principais partidos colombianos. O acordo foi firmado sob a justificativa de se por fim aos violentos conflitos que afetavam, sobretudo, as populações camponesas, e que impulsionavam o êxodo rural, em que a urbanização da população migrante poderia ser uma estratégia para a minimização dos conflitos sociais. A trajetória de implantação do conjunto, diante do contexto político, traz para o debate os limites da urbanização como forma de inclusão social, diante do impedimento de participação na política institucional, que foi imposto à maior parte da população colombiana, durante o período. A trajetória do projeto e da obra desse conjunto habitacional, e da oposição entre dependência e autonomia, frente à ação imperialista norte-americana, marcou a cultura urbana latino-americana no Segundo Pós-Guerra.

Palavras-chave: habitação, América Latina, Bogotá.

URBANIZAÇÃO, ESTADO E PLANEJAMENTO ENTRE 1945 E 1975. ESPECIFIDADES BRASILEIRAS NA AMÉRICA LATINA

Eulalia Portela Negrelos, Camila Ferrari, IAU–USP - Instituto de Arquitetura e Urbanismo – Universidade de São Paulo

Nossas pesquisas propõem um debate sobre a urbanização e as práticas urbanísticas no Brasil entre 1945 e 1975, compreendendo que o desenvolvimentismo, ligado na América Latina aos processos de industrialização baseada na intervenção estatal e na ideia de um projeto de nação, ao qual se vinculou a formulação da “cidade latino-americana” após 1945, teria especificidades no Brasil. No período de 1945 a 1964, em um ambiente propício ao planejamento urbano de cunho modernizante, resultante do amálgama das visões de vanguarda do plano político e do plano técnico, se desenvolvem grandes planos nacionais (SALTE, METAS, TRIENAL) que, contudo, não abrangem planos setoriais. No setor habitacional, a política baseada na atuação dos IAPs não apenas continua, mas é reforçada com a Fundação da Casa Popular e com a liberação da criação de órgãos estaduais. No período seguinte, a partir do golpe militar em 1964 – com a nova institucionalização da habitação e do planejamento – até 1975, com a extinção do SERFHAU, planos setoriais são desenvolvidos (PLANHAP e PLANASA, no nível nacional; CURA com grandes projetos metropolitanos; PDDIs no planejamento municipal), com uma aproximação funcional entre Estado e grupos técnicos (consultorias, engenharias consultivas) em grandes licitações para a produção extensiva de habitação e cidade, em um quadro de modernização conservadora com valorização das grandes obras de infraestrutura. As especificidades do desenvolvimentismo no Brasil se manifestam, portanto, na comparação destes dois períodos, em dois pontos que destacamos neste trabalho: a relação entre Estado e plano técnico e as características ou modalidades dos planos desenvolvidos. entre Estado e grupos técnicos (consultorias, engenharias consultivas) em grandes licitações para a produção extensiva de habitação e cidade, em um quadro de modernização conservadora com valorização das grandes obras de infraestrutura. As especificidades do desenvolvimentismo no Brasil se manifestam, portanto, na comparação destes dois períodos, em dois pontos que destacamos neste trabalho: a relação entre Estado e plano técnico e as características ou modalidades dos planos desenvolvidos.

Palavras-chave: urbanização, planejamento, desenvolvimentismo.

CULTURAS (POPULARES), ARQUITECTURAS (POPULARES) Y CIUDADES (POPULARES): UNA VISIÓN DE SUDAMÉRICA A TRAVÉS DE LAS PROPUESTAS DE JOHN TURNER, 1963-1976

José Carlos Huapaya Espinoza, Faculdade de Arquitetura - Universidade Federal da Bahia;

Eulalia Hernández Ciro, Facultad de Ciencias Humanas y Económicas - Universidad Nacional de Colombia – Sede Medellín

Como afirma Almandoz (2009), a partir de la década de 1960, y retomando algunas experiencias en “países centrales”, en América Latina se propone la conexión entre “industrialización, urbanización y modernización” que tenía como finalidad “la transición demográfica y el consecuente cambio social”. A pesar de ello, para ese autor, al finalizar dicha década se hizo evidente el desbalance entre la frágil industrialización y los procesos intensos de urbanización, mostrando que no se podría llegar al deseado desarrollo al estilo cepalino. Este momento coincide con la llamada “modernización conservadora” (1964-1980), señalada por Bielschowsky (2011) y Pochmann (2015); con algunos importantes aportes sobre los procesos de integración social como los de “Germani sobre la participación de las poblaciones recién llegadas a zonas urbanas” (Gohn, 2014); con la formación de diversos movimientos sociales y formas organizativas barriales, que fueron importantes para la consolidación de los barrios y; con las consecuencias de la “crisis contemporánea” que según Neira (1985) solo podrían enfrentarse llevando en consideración los siguientes aspectos: descentralización y participación, cambios institucionales y cambios en la actitud de los técnicos. La propuesta de esta ponencia se incluye en este contexto y busca explorar las contribuciones del arquitecto británico John F. C. Turner al debate sobre los aspectos positivos de la ciudad informal y a la valorización de la cultura y arquitectura popular. Para ello, retomaremos una serie de publicaciones claves, como Dwelling resources in South America (1963) y Vivienda. Todo el poder para los usuarios (1976) y algunos estudios de caso en Sudamérica.

Palavras-chave: John Turner, cidade popular, América do Sul.

A CRIAÇÃO DA SUPERINTENDÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE (PLAMBEL) NOS ANOS 1970: AVANÇOS E LIMITES

Elisangela de Almeida Chiquito, EA – UFMG - Escola de Arquitetura – Universidade Federal de Minas Gerais

A Superintendência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte (Plambel) foi criada em 1974, a partir de seu desmembramento da Fundação João Pinheiro, como uma autarquia estadual responsável pelo planejamento da RMBH e atuou por mais de 20 anos na elaboração de uma vasta gama de estudos e planos para o desenvolvimento da região, assim como foi responsável pela formação de uma geração de planejadores em Minas Gerais. A instituição, extinta em 1996, teve seu período áureo nos anos 1970, durante o Regime Militar (Tonucci, 2012). Trata-se de discutir a criação da PLAMBEL e sua atuação durante os anos 1970, relacionando com a conjuntura política que a possibilita e com os planos de desenvolvimento em nível federal do período, sobretudo o II PND. Busca-se, dessa forma, a partir da experiência mineira, contribuir para a compreensão da prática do urbanismo no Brasil e sua institucionalização, discutindo a complexidade inerente a esse processo, seus limites, avanços e ambiguidades considerando as condições impostas pelo contexto político, econômico e institucional e visando superar visões generalizantes da inefetividade do planejamento. autarquia estadual responsável pelo planejamento da RMBH e atuou por mais de 20 anos na elaboração de uma vasta gama de estudos e planos para o desenvolvimento da região, assim como foi responsável pela formação de uma geração de planejadores em Minas Gerais. A instituição, extinta em 1996, teve seu período áureo nos anos 1970, durante o Regime Militar (Tonucci, 2012). Trata-se de discutir a criação da PLAMBEL e sua atuação durante os anos 1970, relacionando com a conjuntura política que a possibilita e com os planos de desenvolvimento em nível federal do período, sobretudo o II PND. Busca-se, dessa forma, a partir da experiência mineira, contribuir para a compreensão da prática do urbanismo no Brasil e sua institucionalização, discutindo a complexidade inerente a esse processo, seus limites, avanços e ambiguidades considerando as condições impostas pelo contexto político, econômico e institucional e visando superar visões generalizantes da inefetividade do planejamento.

Palavras-chave: Urbanismo, planejamento metropolitano, PLAMBEL

Publicado
2019-05-11
Seção
Sessão Livre