SL13 De Promotor à Infrator: Como Resiste o Mercado Imobiliário as Teias da Crise da Acumulação Urbana
Resumo
De Promotor à Infrator: Como Resiste o Mercado Imobiliário as Teias da Crise da Acumulação Urbana De Promotor à Infrator: Como Resiste o Mercado Imobiliário as Teias da Crise da Acumulação Urbana
Coordenadora: Suely Maria Ribeiro Leal, UFPE, suelyleal@terra.com.br
Debatedor: Oscar Alfonso, Universidad Externado, BogotaColombia, oscar.alfonso@uexternado.edu.co
O avanço nas duas últimas décadas dos paradigmas que orientam o neoliberalismo: menos Estado (menos regulação, menos planejamento) e mais Mercado veio a fortalecer a ação empresarial e empreendedora nas cidades brasileiras, pela via dos governos locais e estaduais. As novas formas de governança urbana no exercício do poder e o fortalecimento da relação entre o público e o privado, dai derivadas, intensificaram a dinâmica da acumulação urbana. Um marco desse tipo de governança foi a associação entre atores privados e administrações públicas na implantação ou gestão de grandes projetos urbanos. Distintamente dos meios tradicionais de regulação de políticas publicas, os grandes projetos surgidos nos anos recentes, se pautam por promover intervenções que envolvem mudanças significativas no espaço urbano. Para OLIVEIRA, F. L (2012,p 79), [...] grandes projetos – entendidos como aqueles capazes de promover rupturas significativas nas formas de reprodução e apropriação social do espaço urbano – têm características próprias que mobilizam novas justificativas e novos processos de legitimação para a articulação entre governos e interesses privados para a operação de transformações no ambiente construído, além de novas formas de planejamento e práticas específicas de relacionamento entre governos, empresariado e a população em geral. Nas condições acima mencionadas o meio urbano e social se vêem transformados por intervenções de natureza técnica e política nas quais os agentes econômicos se moldam pelo ideário do empresariamento afetando a geografia do espaço e de seu território e permitindo o acesso do econômico aos meandros de todas as esferas da vida coletiva. O capitalismo assume novas formas de hegemonia capitaneadaspelo capital financeiro, que passa a impor suas influências na dinâmica econômica provocando instabilidade e induzindo uma constante reanimação do consumo e da ação produtivista na administração pública e nas instituições sociais. A capacidade do econômico de se imiscuir em toda parte, caracterizadapor uma acumulação urbana comandada pelo capital financeiro, vem trazendo a apatia social,o aumento da violência e a destruição de valores democráticos da cultura urbana. Conforme afirma Harvey a acumulação urbana depende da destruição criativa e da subordinação de formas de produção e consumo,da difusão de valores culturais que fortaleçam a competitividade, da sucção de mais-valia gerada em escalas que transcendem a cidade (HARVEY, 1980), do controle de processos de valorização da terra urbana, da incorporação de conhecimento técnico no aumento da produtividade, da destinação de parte significativa da poupança das famílias e do capital público à expansão da produção, do acesso a valores de uso pela via exclusiva do mercado, e de convenções que estabeleçam a equivalência entre as mercadorias, incluindo o trabalho. Os grandes projetos urbanos, apesar de suas diferenças, particularizam em conjunto a evolução recente da acumulação urbana: shoppings centers, condomínios fechados, prédios de escritórios e edifícios inteligentes e, com certo exagero, áreas revitalizadas (NASCIMENTO, 2008), áreas essas que, por suas emissões estéticas unívocas, podem adquirir características similares às do objeto. Estes tipos de projetos entraram em efervescência na década passada e foram viabilizados, sobretudo, por meio de parcerias entre atores privados e administrações públicas para a implantação ou gestão de grandes projetos urbanos. Foram responsáveis pelo intenso acirramento da acumulação urbana nas metrópoles brasileiras, tendo como vetores principais o mercado imobiliário e o capital financeiro. Foram desencadeados em formas diversas, a exemplos de bairros e cidades planejadas, revitalização de áreas centrais, processos de incorporação e transformação da estrutura fundiária e de geração e apropriação de mais-valias imobiliárias em áreas rurais, projetos urbanísticos e arquitetônicos associados à obras de infraestrutura etc.Aonde estes projetos vigoraram, provocaram impactos muitas vezes danosos sobre os espaços físico, social e ambiental, e contribuíram para a consolidação de mudanças na dinâmica espacial, política, institucional etc. Em relação as áreas centrais, percebe-se a urgência de análises sobre o retorno do interesse do capital por essas localidades, o que tem significado processos de revitalização e ou renovação com implicações nos seus respectivos mercados imobiliários. No caso do Brasil, citamse como exemplos os centros históricos das cidades do Rio de Janeiro e do Recife. Tais processos, segundo Albuquerque e Lacerda (2016) vem ocorrendo mediante aparatos jurídicos de normas indutoras– à exemplo da renúncia fiscal de Imposto sobre Serviço (ISS) –, cessão de espaços construídos por parte do poder público, criação de organizações sociais para gerir esses espaços etc. No caso do Centro Histórico do Recife, a Organização Social instituída vem se tornado um importante proprietário de imóveis e, ao mesmo tempo, tem assumido as funções de promotor imobiliário com poderes de capitanear o funcionamentodo mercado imobiliário.Não sem razão, vem ocorrendo nesse Centrointensa valorização dos seus bens imobiliários. Embora, nas suas linhas essenciais, o processo de valorização assuma características gerais– isto é presentes em qualquer uma das áreas históricas objeto de intervenção –, apresentaparticularidades dependentes dos tipos de normas indutoras adotadas, da dimensão do processo de revitalização e ou renovação, da origem dos capitais investidos, dos atores envolvidos. Ademais, o funcionamento do mercadoimobiliário nessas áreas é bastante diferenciado quando comparados ao de habitações novas, mais frequentemente estudados. Uma crítica que pode ser dirigida às parcerias originadas pela gama de projetos acima citadosé sobre o ônus oriundo dos investimentos e riscos que recaem, sobretudo, sobre o poder público. Como afirma Harvey (2006:27) "os regulados começam a escrever as regras da regulação, enquanto o modo de tomada de decisão 'público' se torna cada vez mais opaco. Desse modo, na parceria público privada há uma pactuação entre o Estado e o mercado visando garantir o aumento da acumulação do capital. A emergência da crise econômica mundial, e a consequêntetendência à queda na taxa de lucro e à retração dos investimentos levaram a redução da acumulação urbana veiculada pelos grandes projetos, tendo em vista que o mercado imobiliário aparece como principal motor da crise. É no contexto temporal de 2009 que ocorre a mais importante crise econômica e financeira mundial desde o final da Segunda Guerra Mundial. Para François Chesnais, [...]. Essa crise começou no final de julho de 2007 e sofreu um salto qualitativo em setembro de 2008. O discurso “nada de crise aqui” foi sustentado em certo número de países, dentre os quais o Brasil. A ideia de diferenciação internamente a uma totalidade hierarquizada ajuda a perceber as diferenças nas relações de cada país no mercado mundial. Ela permite compreender porque os ritmos de desenvolvimento e as formas, assumidas por uma crise enorme tal como a crise atual, podem eles próprios ser diferenciados. Dessa forma, The Economistpôde lançar no seu site, em 14 de setembro de 2009, um artigo longo e substancial, intitulado “Brazilandthecrisis: late in, first out”. O autor explica que, segundo os critérios de comparação internacionais mais frequentemente utilizados, o Brasil foi bem menos atingido pela crise mundial que a maioria dos outros países, e que ele seria um dos primeiros das Américas a superá-la. (Chesnais, 2009, p. 26). No entanto, o horizonte otimista traçado pelo The Economistfoidesfeito. O incessante acirramento da crise econômica brasileira em 2015 não parecia um fato esperado em 2008, quando a maior potência mundial sofre uma grave desaceleração na sua economia. A forte aceleração da crise econômica e política brasileira entre 2015 e 2016 nos conduz a hipótese de estar havendo, por parte dos empreendedores e investidores, a dificuldade de manterem os arranjos de governança que pautaram suas ações nos anos recentes, veiculados pelas parcerias público/privada e por um modelo de governança empreendedora que deu sustentação aos grandes projetos urbanos. Hoje o que está em jogo são iniciativas dos grupos conservadores no poder,para derrotar o projeto democrático, desencadeadas por meio do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, e aceleradas com a inversão da correlação de forças dos segmentos progressistas acarretando a retração do estadosocial e estimulando o avanço da acumulação capitaneada pelo mercado. Neste cenário há a necessidade premente por parte do capital de fazer com que os setores indutores da acumulação urbana capitalista voltem a crescer, especialmente, o mercado imobiliário dirigido às classes de alta renda, e o retorno à cena dos grandes projetos urbanos metropolitanos capitaneados pelo papel do empresariamento das cidades exercido pelos governos estaduais e municipais. Dito de outro modo, a retomada dos arranjos institucionais de governança publico/privada. O objetivo desta Sessão Livre é avaliar se a dinâmica da acumulação urbana pode se manter diante da retração da produção imobiliária e que efeitos podem advir sobre o espaço social e econômico das cidades brasileiras, ameaçadas, inclusive, em seus valores democráticos do projeto consolidado em curso. Palavras Chave: acumulação urbana; grandes projetos; mercado imobiliário.
O REVÉS DA CRISE DO MERCADO FRENTE À CRISE DO ESTADO: A RETRAÇÃO DA ACUMULAÇÃO URBANA NAS CIDADES BRASILEIRAS
Suely Maria Ribeiro Leal, UFPE
A evidente sintonia entre a crise econômica do estado brasileiro e a crise do capital imobiliário leva a hipótese de estar havendo uma retração do processo de acumulação urbana nas cidades brasileiras. Ambas se situam em um contexto mais amplo da crise econômica mundial que tem afetado os países capitalistas desenvolvidos e periféricos desde 2008. O Brasil, a partir de 2015, tornou-se celeiro de uma crise de governabilidade econômica e política. Nessas condições, estados e municípios metropolitanos se vêem diante da impossibilidade de manterem os arranjos de governança que pautaram suas ações nos anos recentes, veiculados pelas parcerias público/privada e por um modelo de governança empreendedora que deu sustentação aos grandes projetos urbanos. O objetivo deste texto é debater sobre a capacidade de sustentação da dinâmica da acumulação urbana diante da retração da produção imobiliária. Palavras Chave: acumulação urbana; grandes projetos; mercado imobiliário.
CRISE DE INVESTIMENTOS PÚBLICOS (DIRETOS E INDIRETOS) EM CENTROS HISTÓRICOS BRASILEIROS?
Norma Lacerda, UFPE
Nos anos 1990, o cenário econômico brasileiro, aliado ao processo de descentralização políticoadministrativa instigou diversos governos locais a aderirem ao modelo de city marketing, visando à atração de empresas. Consoante Fernandes (2001), a criação de novos postos de trabalho oferecia os argumentos para justificar a concentração dos investimentos públicos e privados em poucas e seletivas áreas das cidades. Dentre elas, os centros históricos passaram a ser reconhecidos como possuidores de um charme especial –tributário do seu inquestionável patrimônio histórico. Todavia os investimentos nessas centralidades não ocorreriam sem políticas de incentivos, ou melhor de benesses às empresas, como mostrado por Lacerda e Fernandes (2015). Estas realizaram-se e vem ocorrendo (mesmo no atual contexto de crise econômica), mediante dotação/renovação de infraestrutura, cessão de terrenos e de espaços físicos, estímulos financeiros e renúncias fiscais, com repercussões no funcionamento do mercado imobiliário nesses centros. Quanto aos estudos sobre essas localidades, grosso modo, não tem tido como objetivo desvendar o funcionamento do aludido mercado, tão diferente daquele relativo a unidades habitacionais novas, largamente estudado. Diante do exposto, pretende-se mostrar as características do aludido mercado– tomando por balizamento o Centro Histórico do Recife–; evidenciar que o retorno do capital aos centros históricos é tributário de políticas públicas; atendendo parcialmente ao interesse público e não se retraindo frente à crise econômica; e,como desdobramento, propor um esboço interpretativo do funcionamento do mercado em questão, considerando-se os últimos 25 anos. Palavras-Chave:mercado imobiliário; centros históricos; políticas de investimentos.
O CAPITAL IMOBILIÁRIO NA ENCRUZILHADA DA CRISE DA ACUMULAÇÃO URBANA NO BRASIL ATUAL
Pedro Abramo Campos, IPPUR/UFRJ
O Brasil entra na segunda metade da década imerso em uma crise econômica, política e fiscal. As mudanças políticas, ocorridas em 2016, dramatizam as suas consequências, que sinaliza uma inflexão na trajetória de crescimento econômico com incorporação de setores populares ao mercado de consumo e manutenção de um processo de enriquecimento dos de maior estrato social, característicada primeira década do século XXI. Essa inflexão impõe uma redefinição nas estratégias dos atores que protagonizam o processo de acumulação urbana. Propomos discutir duas possíveis estratégias desses atores. A primeira é de caráter defensivo e leva aos capitais imobiliários a voltarem a atuar na faixa de demanda dos estratos superiores. Essa estratégia impõe uma redefinição da relação dos capitais imobiliários com a estrutura normativa urbana, em particular, uma redefinição da sua relação com os planos diretores que incorporam instrumentos urbanos distributivos e perspectivas restritivas. A segunda é continuar com a estratégia de promoção de grandes projetos urbanos e de redesenho de funcionalidades intra-urbanas nas metrópoles brasileiras. O ponto crítico dessa estratégia é o financiamento. Uma possibilidade é o dos capitais imobiliários buscarem no mercado internacional parceiros para os seus projetos. Essa opção pode abrir um espaço de conflito inter-capitalista e redefinir as estratégias e alianças dos poderes locais e os projetos de resistência política da esquerda urbana. O trabalho, de caráter especulativo, propõe um exercício sobre as estratégias dos capitais imobiliários diante da crise urbana e abre a discussão sobre as estratégias possíveis para formular uma agenda urbana progressista, redistributivista e democrática. Palavras chave: acumulação urbana, dinâmica imobiliária e estrutura urbana.