SL9 Por uma Política do Espaço
Towards a Politics of Space
Resumo
Por uma Política do EspaçoPor uma Política do Espaço Towards a Politics of Space Coordenador: Ester Limonad, Universidade Federal Fluminense, Professor Titular, ester_limonad@yahoo.com Debatedor: Roberto Luís Monte-Mór, Universidade Federal de Minas Gerais, Professor Associado, montemor@cedeplar.ufmg.br
As ideias de Henri Lefebvre contribuíram e seguem a contribuir para reflexões diversas sobre a produção do espaço e o direito à cidade. Durante os últimos anos, suas teorias sobre a cidade, a sociedade urbana e o direito à cidade foram discutidas, apropriadas, modificadas e, por vezes, tiveram seu significado adulterado em oposição ao seu pensamento e, mesmo, às suas proposições originais. As ideias de Henri Lefebvre contribuíram e seguem a contribuir para reflexões diversas sobre a produção do espaço e o direito à cidade. Durante os últimos anos, suas teorias sobre a cidade, a sociedade urbana e o direito à cidade foram discutidas, apropriadas, modificadas e, por vezes, tiveram seu significado adulterado em oposição ao seu pensamento e, mesmo, às suas proposições originais. Nossa proposta aqui se estende para além dessas questões e para além da tendência vigente de banalização da apropriação do pensamento de Henri Lefebvre. Seguimos aqui a provocação de Busquet (2012) sobre as apropriações equivocadas do pensamento de Lefebvre e damos continuidade a discussões encetadas por este grupo em anos anteriores. Para Busquet (2012) enquanto alguns pensadores tem buscado elaborar aplicações práticas e identificar a influência de suas teorias e práticas na produção do espaço, bem como abordar suas consequências e desdobramentos, em termos do direito à cidade; muitos outros pensadores ignoram, ou mesmo deixam de lado, o propósito concreto maior de sua reflexão, qual seja: a produção de um espaço diferencial, a construção de uma outra sociedade. Proposta essa, que entendemos com um sentido político transformador explícito. A qual serviu de base para a crítica de Lefebvre (1991) ao socialismo real, cuja falha em criar uma outra sociedade igualitária e equânime manifestou-se e, ainda, manifesta-se na incapacidade desses países com regimes autodesignados socialistas em criarem um outro espaço social, o que dizer de um espaço diferencial. De certa forma, muitos estudos embora se debrucem sobre as diversas ideias de Lefebvre sobre a representação, a alienação e mesmo sobre a modernidade, ou ignoram, ou deixam de lado intencionalmente, as condições em que estes processos são gestados, se expressam e se desenvolvem. E esvaziam, despem suas proposições de seu caráter político, propositivo e emancipatório. Deixam de lado, assim, sem mais nem menos, e desassociam todas referências às contradições do capitalismo, entre capital e trabalho, ao papel dos movimentos sociais e, principalmente, à luta de classes e ao conflito social. Tendem a transmutar, assim, as proposições de Lefebvre em propostas humanistas descoladas de um sentido político transformador. Operam, dessa forma, uma reducionismo nas propostas de Henri Lefebvre. O resultado se traduz, muitas vezes, em proposições reformistas e/ou conservadoras de curto alcance, que contribuem mais para a manutenção do status quo do que para a produção de um outro espaço, de uma outra sociedade. Ou, ainda, em apropriações com base nos termos adotados como, por exemplo, a discussão legal e jurídica encetada por muitos pensadores do campo do direito sobre o “direito à cidade”, transformando, assim, uma discussão política em uma discussão normativa ou, ainda, reduzindo-a a uma discussão técnica em termos de acessibilidade a bens e serviços e a mobilidade espacial, como soem fazer muitos planejadores, urbanistas e tecnocratas. Considerando esse quadro geral, a presente proposta de sessão livre dá continuidade a discussões e reflexões anteriores desse grupo, e situa-se em uma perspectiva de resgate do sentido político, da necessidade de transformação e de mudança social das propostas de Henri Lefebvre. Trata-se, assim, de situar o pensamento crítico de Lefebvre sobre o espaço e sua relação intrínseca com o político, com o pensar o espaço, as contradições, a transformação social, em um resgate das possibilidades de uma práxis, como mediação espaço-temporal da relação homem-natureza, práxis entendida não só como uma prática pura e simples, mas como uma prática política que se nutre e alimenta a teoria e os instrumentos da ação, que transforma as condições gerais e os homens na perspectiva da transformação social. Isso nos remete à crítica de Lefebvre às ideologias, ao idealismo urbanístico, por um lado. E, por outro lado, nos remete à questão da utopia, inerente ao pensamento de Lefebvre. Ao falar da utopia, referimo-nos aqui à utopia concreta e não à utopia idealística, referimo-nos a aquela utopia que se transforma constantemente em cada momento de avanço, enquanto um horizonte que nos faz pensar e caminhar, em uma analogia à ideia de Eduardo Galeano em Ventana sobre la Utopía “Ella está en el horizonte – dice Fernando Birri -. Me acerco dos pasos, ella se aleja dos pasos. Camino diez pasos y el horizonte se corre diez pasos más allá́. Por mucho que yocami ne, nunca la alcanzaré. ¿Para qué sirve la utopía? Para eso sirve: para caminar.” (Galeano, 1993, p. 230). utopia, referimo-nos aqui à utopia concreta e não à utopia idealística, referimo-nos a aquela utopia que se transforma constantemente em cada momento de avanço, enquanto um horizonte que nos faz pensar e caminhar, em uma analogia à ideia de Eduardo Galeano em Ventana sobre la Utopía “Ella está en el horizonte – dice Fernando Birri -. Me acerco dos pasos, ella se aleja dos pasos. Camino diez pasos y el horizonte se corre diez pasos más allá́. Por mucho que yocami ne, nunca la alcanzaré. ¿Para qué sirve la utopía? Para eso sirve: para caminar.” (Galeano, 1993, p. 230). Enfim, grosso modo, trata-se de uma utopia concreta, que tem parentesco com a perspectiva utopiana (Limonad, 2016), com o ainda não (noch-nicht) de Ernst Bloch (2007) em sua obra o Princípio Esperança e não com perspectivas utopísticas de idealização de um modelo “congelado” de sociedade ideal, que contribuiu para alimentar vieses políticos autoritários de cunho fascista, nazista e do socialismo real stalinista. E esse caminhar, se faz, se nutre e constrói a partir de passos e ações diferenciadas, que gradualmente se acumulam ao longo do tempo. E assim, interagem com as práticas espaciais hegemônicas e subordinadas, as quais informam e formam pouco a pouco a produção do espaço, e que com isso produzem aqui e ali espaços que poderiam se caracterizar como manifestações de espaços diferenciais. A abordagem de Lefebvre sobre o espaço social e a realidade urbana tem relação direta com a reprodução geral das relações sociais de produção, bem como com o modo de produção. Reprodução essa que abraça desde a reprodução biofisiológica da família, a reprodução da força de trabalho e a reprodução da sociedade. Rejeita, assim, como limitada a proposição de tratar o espaço apenas a partir da reprodução dos meios de produção. É nessa perspectiva que se insere a urbanização como um processo de estruturação territorial, como uma extensificação do tecido urbano no espaço social. E é, ainda nessa perspectiva que cabe ser analisada a relação homemnatureza enquanto mediação para a produção do espaço social. Enfim, nossa proposta tem por meta tratar da relação espaço e política, seja em termos das possibilidades concretas de ação e intervenção que possam se abrir, em termos de uma práxis transformadora, seja em termos da reflexão dos processos ora em curso. O que se desdobra em vieses diversos relacionados, por um lado, à concretude das categorias de Lefebvre e, por outro lado, a importância da produção do espaço em relação ao pensamento utopiano (Bloch, 2007; Lefebvre, 2009) possível e mutável, enquanto um vir a ser fundado no aqui e agora, em constante mutação. Palavras-chave: Planejamento, Política do Espaço, Direito à Cidade, Lefebvre. Referências Bibliográficas BLOCH, Ernst. El Principio Esperanza. Madrid: Editorial Trotta. 3vs, 2007. BUSQUET, Grégory. Political Space in the Work of Henri Lefebvre: Ideology and Utopia. justice spatiale | spatial justice. [online]. Nanterre: Université Paris Ouest. n° 5 déc. 2012-déc. 2013 | dec. 2012-dec. 2013. <http://www.jssj.org/wp-content/uploads/2013/09/JSSJ53.en_1.pdf>[27 de marzo de 2016] GALEANO, Eduardo. Las palabras andantes. Buenos Aires: Catálogos, 1993.
LEFEBVRE, Henri. State, Space, World. Selected Essays. Minneapolis; University of Minnesota Press, 2009. LEFEBVRE, Henri. State, Space, World. Selected Essays. Minneapolis; University of Minnesota Press, 2009. LEFEBVRE, Henri. The Production of Space. Oxford: Blackwell, 1991. LIMONAD, Ester. Utopias urbanas, sonhos ou pesadelos? Cortando as cabeças da Hidra de Lerna. In: Actas... XIV Coloquio Internacional de Geocrítica: Las utopías y la construcción de la sociedad del futuro. Barcelona, 2016. <http://www.ub.edu/geocrit/xivcoloquio/EsterLimonad.pdf>
O PLANEJAMENTO SUBVERSIVO COMO SUBVERSÃO DO PLANEJAMENTO: EM BUSCA DE UMA PRÁXIS TRANSFORMADORA Rainer Randolph O PLANEJAMENTO SUBVERSIVO COMO SUBVERSÃO DO PLANEJAMENTO: EM BUSCA DE UMA PRÁXIS TRANSFORMADORA Rainer Randolph Em análises anteriores sobre a trajetória dos discursos do planejamento e de práticas planejadores chegou-se à conclusão que a superação dos seus impasses, incoerências, aporias e limitações exige uma perspectiva dialética. Em outras palavras, necessita de uma superação dialética para algum “novo planejamento” conseguir romper com as práticas anteriores. Para tal é preciso superar, dialeticamente, as limitações de processos fundamentados quase exclusivamente em representações e discussões simbólicas (discursos), por um lado, ou o mero “intervencionismo”, por outro. A chave da compreensão deste rompimento se encontra naquilo que o Vaneigem chamou de “unificação de práticas subversivas com condições objetivas da sociedade” – da necessidade de ter algum tipo de articulação das agências subversivas no mundo da vida com um “componente” estrutural que as unifique. Essa práxis de unificação poderia ser considerada semelhante, se bem contrária, àquelas práticas que foram chamadas de “planejamento”. Contrário porque este planejamento como “práxis unificadora” tem como finalidade de se opor – e não “mediar” – as lógicas abstratas reinando nas relações de produção e nas representações do espaço – no sentido lefebvriano - e, com isso, fortalecer uma lógica substantiva a partir de transformações de práticas cotidianas e do aproveitamento do potencial subversivo dos espaços de representação que vem se opor às representações proferidas pelo planejamento. É nesse sentido que este “planejamento” não seria “revolucionário”, mas também não apenas “insurgente”, mas “subversivo – explorando um potencial presente na própria vida social.
O DIREITO À CIDADE DE HENRI LEFEBVRE NA “ERA DOS DIREITOS”* Ana Fani Alessandri Carlos O DIREITO À CIDADE DE HENRI LEFEBVRE NA “ERA DOS DIREITOS”* Ana Fani Alessandri Carlos A obra de Henri Lefebvre, adentra o século XXI a partir da centralidade, que ganha na vida moderna, a construção do direto à cidade. Nossa tese é que o “direto a cidade” tal qual desenvolvido por Lefebvre se situa no momento da história aonde a cidade se revela como o negativo da vida urbana imersa na prática alienada. É, portanto, um movimento do pensamento que ao analisar a realidade, como totalidade social aberta e contraditória, real e virtual se depara com a exigência de superação desta realidade impeditiva da realização do humano. Portanto, em sua submissão à lógica do capital, a sociedade traz em si a resistência aos poderes e lógicas hegemônicas abrindo caminho para pensar e sonhar com a utopia que, como sabemos, não se localiza na teoria do direto, nem se constrói nos termos jurídicos dos diretos do homem ou da sociedade. sua submissão à lógica do capital, a sociedade traz em si a resistência aos poderes e lógicas hegemônicas abrindo caminho para pensar e sonhar com a utopia que, como sabemos, não se localiza na teoria do direto, nem se constrói nos termos jurídicos dos diretos do homem ou da sociedade. Mas se como escreve Bobbio “os diretos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual” (2004:5), resta saber qual o momento histórico que permitiu pensar a necessidade do estabelecimento de um direto à cidade passível de ser reconhecido como uma nova esfera de proteção através de um direito estabelecido juridicamente.
ABSTRAÇÕES E CONCRETUDES EM CONCEITOS DE LEFEBVRE: URBANO E ESPAÇO Geraldo Magela Costa ABSTRAÇÕES E CONCRETUDES EM CONCEITOS DE LEFEBVRE: URBANO E ESPAÇO Geraldo Magela Costa O texto tem como foco uma tentativa de discutir os principais conceitos criados por Lefebvre para o entendimento do que podemos chamar a problemática urbana, em especial a brasileira. Há abstrações teóricas importantes a exemplo dos conceitos de urbano e de sociedade urbana, que expressam uma utopia, e há conceitos que, na sua formulação, expressam uma aproximação concreta com a realidade socioespacial do capitalismo. Incluem-se entre estes últimos aqueles conceitos criados e (re)afirmados especialmente em “a produção do espaço”: espaço abstrato, espaço absoluto, espaço diferencial, bem como a tríade espaço percebido, espaço concebido, espaço vivido. Há no desenvolvimento desses conceitos uma proposta original, ontológica, de análise da realidade socioespacial capitalista e que incorpora a essencial dimensão histórica do processo de produção do espaço, expressando sua atualidade para a análise da realidade socioespacial em dinâmico processo de transformação. Portanto, ao lado do reconhecimento da importância dos conceitos abstratos contidos especialmente em “o direito à cidade” e “a revolução urbana” como fundamentais para se pensar a possibilidade da ação transformadora e emancipatória, o presente texto procura buscar em “a produção do espaço” os conceitos e ideias que permitem a aproximação com a realidade socioespacial em uma perspectiva históricoconcreta, afirmando a essencialidade deste tipo de abordagem para jogar luz no “campo cego” da fase crítica do avanço da urbanização em seu processo de universalização - ou, pensando-se na utopia lefebvriana, na “planetarização do urbano” -, bem como o que isto significa em termos de possibilidades da praxis emancipatória.