GT2 - 265 É A LUTA DE CLASSES, ESTÚPIDO!
Resumo
Oportunismo político, compreensão pobre de como as coisas funcionam em sociedade, ou-tros fatores, ou tudo junto: fato é que a recente campanha eleitoral no Brasil foi profunda-mente despolitizada. E, paradoxalmente, talvez “nunca antes na história deste país” uma campanha foi tão flagrantemente eivada de conflitos de classe, interesses contraditórios, polarização política. Embora sem dizer o nome, a luta de classes veio para a boca de cena e reafirmou a máxima marxista de que ela é o “motor da história”. Isto ficou cristalino no se-gundo turno: de um lado, o trabalho, embora num arco de alianças que a muitos de nós in-comoda mas que taticamente tem se provado inevitável ou indispensável para seguir adian-te com um projeto de país onde os interesses populares são hegemônicos; do outro lado, o capital, ou as frações de classe mais retrógradas dele. (Sob a hegemonia dos interesses populares, frações da burguesia mais lúcidas viram a possibilidade de enormes ganhos na incorporação ao mercado de grandes parcelas da população até então fora dele – incorpo-ração que vem acontecendo, no corrente modelo, nos últimos oito anos. O resultado: todos ganharam, porém, e o que é fundamental a caracterizar a hegemonia, a renda dos mais ricos cresceu 1,5%, a dos mais pobres, 8,0%. Bingo.)
A despolitização ideologizada das campanhas eleitorais no Brasil reproduz-se em outras esferas da sociedade, p.ex. na organização do espaço urbano, na sua apropriação pelas classes sociais, nos conflitos de uso do solo, nas normativas a regerem o que deve estar onde e como, nas políticas habitacionais que induzem padrões de segregação socioespacial etc. Despolitiza-se a luta pelo “direito à cidade”. Cidade de extremos, Brasília exemplifica emblematicamente a manifestação desses conflitos e os eufemismos que os referem. (Aqui, “Brasília” é a “cidade real”, a metrópole cuja conurbação extrapola as fronteiras do Distrito Federal e que, segundo os dados preliminares do Censo de 2010, beira os três e meio mi-lhões de habitantes.) O tombamento da capital brasileira como Patrimônio Cultural da Hu-manidade oferece um recurso ideológico precioso pelo qual os conflitos de classe são mas-carados: medidas de repressão a interesses populares são apresentadas como gestos ne-cessários à “preservação do patrimônio”, à “manutenção da ordem”, ou até à “limpeza da cidade”.