SL - 60 GOVERNANÇA DAS ÁGUAS E DESENVOLVIMENTO: TEMAS, ATORES E ESCALAS DE AÇÃO EMERGENTES

  • Fabiano Rocha Diniz
  • Daniela Nogueira Soares
  • Margareth Alheiros
  • Marcelo Coutinho Vargas
Palavras-chave: Águas, Governança, Desenvolvimento, Integração, Sustentabilidade

Resumo

Nas duas últimas décadas, diante da intensidade e freqüência crescentes de eventos climáticos extremos como inundações e secas, a temática da gestão das águas tem atraído um interesse cada vez maior de especialistas das mais distintas formações disciplinares. Os impactos desses eventos sobre as condições do desenvolvimento socioeconômico em nível global passam a ocupar um espaço privilegiado nas preocupações de atores institucionais e cidadãos, impulsionando a reflexão teórico-conceitual e a formulação de desenhos institucionais e políticas públicas voltados ao desafio de equacionar o conflito estabelecido entre os modelos de desenvolvimento em voga e a gestão sustentável das águas.
O leque de questões que emergem desse quadro é vasto. As águas podem ser vistas como recurso natural necessário às mais essenciais atividades humanas, donde a importância de se gerir sua qualidade e as condições de acesso e uso (para consumo e/ou produção) a essas. Elas também são percebidas como fator determinante para a deflagração de desastres naturais que se impõem como limitantes à segurança e à qualidade de vida e são vinculados à perdas e danos que impactam fortemente sobre a economia. Essas mesmas águas podem ser encaradas como condicionantes elementares ao ordenamento dos territórios, podendo ser percebidas como um eixo transversal para a articulação de ações de caráter não apenas hidrológico, mas também urbanístico-ambiental e sociopolítico.
De modo geral, as reflexões acerca desse tema se ancoram em algumas ideias-chave, dentre as quais se pode destacar as noções de integração (intra e intersetorial, interdisciplinar) das ações e de sustentabilidade. Entretanto, tais aspectos passam a ser vislumbrados no contexto de um novo paradigma de gestão do desenvolvimento, centrado nas instituições e na governança.
Eleita como aspecto central da Sessão Livre, a Governança das Águas é abordada pelo viés do equilíbrio entre três dimensões fundamentais: contratual, institucional e participativa, que lhe confereriam a coerência necessária à aplicação equilibrada de ações de planejamento e gestão vinculadas aos diversos vieses de abordagem das questões vinculadas às águas. A interface dessa temática com os condicionantes ao Desenvolvimento é investigada ao se colocar em perspectiva as várias dimensões envolvidas na gestão de águas no país, bem como as suas interfaces com questões que repercutem sobre o processos de planejamento com vistas ao desenvolvimento nacional: ambientais, sociais, econômicas, políticas, urbanísticas etc.
Nossa intenção é de promover um debate no qual se articulem essas dimensões sob um ponto de vista que privilegie a investigação de temas, atores e escalas emergentes. As experiências de outros países serão utilizadas como referências às análises. Para contribuir com essa discussão, tomarão parte da Sessão pesquisadores e representantes institucionais com formações distintas (arquitetura e urbanismo, sociologia, engenharia civil) e experiências complementares (ensino e pesquisa, gestão de políticas públicas, consultoria técnica, projeto).
As diversas contribuições agregadas se referem a problemáticas distintas, porém conectadas entre si. As análises desenvolvidas têm objetos e objetivos distintos, mas que “dialogam” entre si e se complementam; seu conjunto visa a contribuir para o enriquecimento do conhecimento acerca de uma questão que segue sendo lembrada apenas quando da ocorrência de desastres naturais, por seus impactos sobre as populações, seus territórios e suas economias. Pretende-se trazer à tona as questões de fundo vinculadas a tais eventos, na maior parte das vezes vinculadas a más escolhas no processo de planejamento e gestão de águas.
Apesar de não estritamente relacionada à uma espacialidade, a discussão deverá ser orientada por um recorte que privilegie a abragência das questões e de seu enfrentamento, partindo de um olhar sobre aspectos da interrelação águas-desenvolvimento desde a escala das políticas nacionais, passando por questões do impacto de desastres naturais sobre o desenvolvimento que incorporam perspectivas em nível estadual ou regional, até chegar a tratar de questões mais afeitas à escala urbana, ao trazer ao centro do debate inquietações sobre as inovações institucionais necessárias ao quadro atual de gestão de águas no Brasil e sobre os caminhos de aproximação entre as políticas de ordenamento territorial e a governança das águas urbanas.
Desse modo, a primeira contribuição tem um foco mais vasto, que relaciona a boa gestão dos recursos hídricos ao desenvolvimento socioeconômico em nível nacional. Questiona-se a inobservância desse vínculo água-desenvolvimento regional na formulação e implementação da primeira fase da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR). Tomando-se como caso de estudo a iniciativa do Ministério da Integração Nacional de reformular a PNDR em outra base, que põe em destaque a universalização do acesso à água para consumo e produção. Analisam-se os resultados da I Conferência Nacional de Desenvolvimento Regional, que subsidiou a reformulação dessa política tomando como referência os casos de países como Angola, Chile e México. Em comum, as iniciativas têm a preocupação de reduzir as desigualdades regionais, pondo em evidência a necessidade de buscar meios para geração de competitividade, emprego, renda e bem estar, além da fixação da população no seu local de origem.
A segunda intervenção se investe de um caráter mais regional, questionando as perdas e danos relacionados às inundações e seu impacto sobre o desenvolvimento socioeconômico. Correlaciona-se o melhor conhecimento da gestão de riscos e desastres à importância que as ações preventivas assumem na governança em estados e municípios brasileiros com ocorrências freqüentes de deslizamentos e inundações. Demonstra-se essa assertiva pela análise das perdas e danos decorrentes dos desastres, que no Brasil têm as águas de chuvas como um dos mais importantes agentes deflagradores. Tomando como referência as inundações em Santa Catarina (2008), Pernambuco e Alagoas (2010), Região Serrana do Rio de Janeiro (2011) e Região Amazônica (2012), o trabalho alerta à necessidade de considerar esses eventos de maior magnitude na discussão do planejamento e na integração das políticas públicas de desenvolvimento. Baseado em estudos do Banco Mundial, apontam-se os impactos de perdas e danos associados a tais eventos sobre a economia dos estados atingidos. A análise aponta à necessidade de se deslocar a dimensão dos debates para além da Defesa Civil, conquistando espaço nos instrumentos de planejamento urbano e regional e impulsionando a criação de novos modelos de governança para a prevenção de desastres. O terceiro trabalho aborda a Governança das águas urbanas e sua trajetória institucional. Aponta-se como a lógica da oferta, que presidiu a abordagem hidráulica e sanitária dos usos da água (sociais, econômicos), passou ceder espaço a noções como gestão integrada, gestão sustentável, lógica da demanda e abordagem ecológica ou holística dos recursos hídricos em bacias hidrográficas. O trabalho alerta ao novo desafio enfrentado pelo saneamento básico em áreas mais densamente urbanizadas: o uso sustentável da água face à impermeabilização e à ocupação desordenada do solo. Num contexto de incertezas ligadas às mudanças climáticas, destaca-se a necessidade de novas abordagens, sob a ótica de uma governança democrática das águas urbanas. Nesse quadro, fundado em reflexões teórico-conceituais e em análises sobre a situação do setor no país, busca-se resposta a questões vinculadas ao novo arranjo institucional para essa governança, com foco em preocupações como a universalização do acesso aos serviços de saneamento urbano e o uso sustentável dos recursos hídricos. 
A quarta contribuição possui igualmente um enfoque urbano, relacionada à gestão de águas pluviais em uma bacia hidrográfica parcialmente inserida na Região Metropolitana do Recife. Os conflitos oriundos dos movimentos de “conquista” de cursos d’água, terras úmidas e encostas por aterros e cortes de terrenos, como os alagamentos e deslizamento de barreiras, são postos em relação com uma certa territorialidade, associada à precariedade e ao risco socioambiental. Reportando-se ao contexto de mudanças climáticas e a ocorrência mais freqüente de eventos pluviais extremos, questiona-se a capacidade dos modelos de ordenamento e gestão da ocupação urbana em responder ao desafio de promover um desenvolvimento equilibrado do território metropolitano, sobretudo frente às questões afeitas à drenagem. Tomando como caso de estudo a iniciativa da municipalidade de Jaboatão dos Guararapes de elaborar um Plano de Águas, o trabalho aborda como os aspectos de drenagem urbana e de ordenamento territorial se interrelacionam. Tendo a porção a jusante da bacia do rio Jaboatão como área de abrangência física e tomando o controle de águas de chuvas como seu foco central, a experiência municipal é examinada em sua abrangência temática e em sua “coerência”. O Plano de Águas é contraposto às diretrizes conceituais e normativas concernentes aos aspectos de governança de ações águas urbanas, levando-se em consideração os condicionantes urbanístico- ambientais e sociopolíticos da realidade local.

Publicado
2018-11-20
Seção
Sessão Livre