SL - 29 DINÂMICA DEMOGRÁFICA, CONFIGURAÇÕES URBANAS E A AGENDA DA SUSTENTABILIDADE

  • John Sydenstricker-Neto
  • Eduardo L. G. Rios-Neto
  • Harley Silva
  • Roberto-Luis Monte-Mór
  • George Martine
  • Ricardo Ojima
  • Donald R. Sawyer
Palavras-chave: urbanização, desenvolvimento, meio ambiente, sustentabilidade

Resumo

Em outubro de 2011 o mundo atingiu a marca histórica dos 7 bilhões de pessoas. Esta cifra representa mais do que um simples número. Ela instiga a uma reflexão sobre os avanços obtidos pela civilização até o momento, sobre os desafios e as oportunidades que se apresentam no presente e que se delineiam para o futuro. Um dos grandes desafios que se apresenta é achar um ponto de equilíbrio entre o estilo de desenvolvimento que garanta a equidade com qualidade de vida, mas que também preserve os recursos naturais, principalmente levando-se em consideração que por volta do ano 2100 a população mundial poderá atingir um contingente de 10 bilhões de pessoas, ou até mais, dependendo das escolhas reprodutivas que forem feitas daqui para frente.
Um dos diferenciais significativos da forma de ocupação verificada em períodos anteriores da verificada no final do Século XX e projetada para o Século XXI é a massiva presença de conglomerados urbanos. Estimativas indicam que em 2010 mais da metade da população do globo já residia em áreas urbanas e que essa proporção tenderá a 70% por volta de 2050. A urbanização contemporânea se diferencia da anterior em pelo menos em cinco aspectos que têm implicações profundas.
Em primeiro lugar, a sua escala, em termos do porte das cidades é significativa. Em 2012 já havia 26 cidades/regiões metropolitanas com mais de 10 milhões de habitantes. Com exceção da Austrália e Oceania, todos os demais continentes já contavam com cidades representadas nessa lista. Em segundo, não apenas o número dessas cidades/regiões metropolitanas já é expressivo, como a tendência é que o número de cidades com alguns milhões de habitantes crescerá a uma taxa nunca antes vista. Em terceiro lugar, a tradicional concentração de grandes cidades no Ocidente vai aos poucos se tornando um fato histórico; no decorrer desse século essas cidades serão superadas por um número crescente de grandes cidades localizadas na Ásia e África. Em quarto lugar, a tradicional forma concentrada das cidades e de suas atividades vem perdendo força para um modelo mais desconcentrado e expansivo. O clássico e típico “urban spawl” norte americano já está presente em vários países, muitos deles classificados não como “desenvolvidos” mas como “em desenvolvimento”. Finalmente, a função das cidades tem sido bastante redefinida em decorrência da especialização crescente das áreas urbanas e da forma de inserção diferenciada dessas áreas frente ao processo de globalização. Provavelmente, mais importante que cada um desses fatores isolados é a sinergia e interação propiciada pelo seu conjunto.
Mutatis murtandis, o Brasil não está à margem desse processo. Já temos 85% de nossa população residindo em áreas urbanas e as cidades com mais de 1 milhão de habitantes já são uma realidade em todas as regiões brasileiras. Ao mesmo tempo, as metrópoles com maior crescimento na última década estão fora do centro-sul do país, ainda que esse concentre as maiores metrópoles em tamanho absoluto.
Tendo em vista essa realidade, tem havido um movimento crescente do Ministério do Meio Ambiente (MMA) em redirecionar sua agenda de trabalho e responder de forma marcante aos desafios impostos pela urbanização crescente e inexorável. Esse movimento não significa deixar de lado um legado importante do MMA que valorizou a preservação da biodiversidade, a criação de Unidades de Conservação e priorizou em muitos sentidos um olhar para a Região Amazônica. Trata-se de redefinir esse olhar dentro do novo contexto que se apresenta, onde cada vez faz menos sentido falar no rural e urbano “clássicos”, mas pensar e qualificar o território em termos das diversas ruralidades e urbanidades que vão se configurando.
Tendo em vista esse quadro maior, o MMA, CEBRAP-CEM e UFMG-CEDEPLAR propõem, com o apoio do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), a realização de uma sessão livre no próximo Encontro Nacional. O objetivo dessa sessão é propor uma discussão, estabelecer um diálogo e ouvir a comunidade de planejadores urbanos e regionais sobre uma série de questões sobre urbanização, dinâmica populacional e sustentabilidade. Como ponto de partida para essa discussão, essa sessão reunirá quatro trabalhos encomendados pelo MMA em parceria com o UNFPA. Esses trabalhos compõem uma agenda integrada de abordagens e enfoques.
O primeiro trabalho examina as implicações para a política ambiental, do modelo de crescimento de países emergentes, relativamente grandes e populosos como o Brasil. Em todos os países do BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China), o dinamismo econômico parece repousar, em grande parte, na capacidade de manter políticas sociais e produtivas de inclusão dos mais pobres aos mercados e fazer desse novo mercado emergente a alavanca para ampliar a produção doméstica e o investimento. Cabe se perguntar, quais são as conseqüências desse crescimento, que mostra virtudes no social e no econômico, mas não deixa claro ainda o lugar e a forma que deve tomar a componente ambiental nesse modelo? A questão da urbanização e papel das cidades merece destaque nessa reflexão mais geral e comparada.
Os dois trabalhos seguintes, examinam a questão da urbanização brasileira chamando a atenção para a necessidade de tratamento adequado do urbano pela política ambiental do país. A rápida transição para o urbano, associada a processos sociais e econômicos particularmente perversos e uma desatenção flagrante com o manejo dos ativos ambientais, até o presente, impõe a ambos recomendações voltadas para a organização da rede de cidades e gestão urbana brasileira. Nesse sentido, um dos trabalhos chama a atenção para o fato de que a qualidade ambiental precisa ganhar prioridade na organização urbana como parte indissociável do direito à cidade, inclusão social e qualidade de vida de todo os cidadãos. Em grande medida, os princípios de justiça ambiental pelo qual todo o cidadão tem direito a viver num ambiente saudável e lúdico, ainda não se estabeleceram de forma sólida. Mas alguns movimentos, como o que levou à aprovação da Lei de Águas e a criação da Agência Nacional de Águas (ANA), recolocam o debate do princípio da segurança ambiental, nesse caso o da hídrica e do uso múltiplo das águas. Já o segundo enfoca sua reflexão sobre os riscos e impactos de desastres em decorrência das mudanças climáticas e a contribuição que possa dar na orientação das políticas de adaptação ajustadas à realidade das cidades brasileiras. Um fato é inequívoco, a política ambiental deverá se ocupar e estar crescentemente na grande política, se imiscuindo em campos complexos como o de mudanças no padrão de produção e consumo, na matriz limpa de energia e de logística, na organização e gestão das cidades, nos investimentos para mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Finalmente, o quarto trabalho examina a questão da sustentabilidade dando um foco privilegiado para a Região Amazônia. A Amazônia abrange cerca de 60% do território brasileiro, submetido à pressão de uma fronteira econômica em acelerada expansão muito complexa. Convivem lado-à-lado a produção moderna, de grande escala, alta produtividade, padrão mundial e rica com a produção tradicional, tecnologicamente atrasada e pobre. Nessas circunstâncias, cabe perguntar qual o papel do urbano e do capital natural abundante, como fonte de crescimento e inclusão social, com conservação?

Publicado
2018-10-17
Seção
Sessão Livre