SL23 Funcionamento do mercado imobiliário nos centros históricos das cidades do Recife, São Luís e Belém

  • Norma Lacerda
  • Pedro Abramo
  • Helena Lúcia Zagury Tourinho
  • Marluce Wall
  • Suzana Pasternak

Resumo

SL-23. Funcionamento do mercado imobiliário nos centros históricos das cidades do Recife, São Luís e Belém

Coordenadora: Norma Lacerda (UFPE)

Resumo: Os centros históricos (CHs) das cidades brasileiras vêm chamando a atenção de estudiosos à conta de grandes intervenções urbanísticas, sobretudo a partir dos anos 1990. Tais estudos têm se concentrado em análises das mudanças nos perfis socioeconômicos das atividades lá existentes ou mesmo na dinâmica demográfica, com ênfase nos processos de gentrificação ou de reconversão urbana, especialmente para fins de moradia. Com isso, a despeito da centralidade atual do tema Centro Histórico, permanece a lacuna de estudos que subsidiem o entendimento sobre o funcionamento do mercado imobiliário nesses espaços. Diante desta constatação, em 2013, foi iniciada a pesquisa Mercado imobiliário nos centros históricos das cidades brasileiras, envolvendo pesquisadores de três universidades e quatro centros históricos (Recife, Olinda, São Luís e Belém). O objetivo da mesa proposta é apresentar e discutir os resultados preliminares referentes aos CHs das cidades de Recife, Belém e São Luís, resultados baseados em levantamentos de dados secundários e na aplicação de questionários em cerca de 1.082 imóveis localizados nesses centros.

As análises desses dados evidenciam que os seus respectivos mercados não são homogêneos. Cada um deles é formado por submercados, identificáveis a partir dos vários níveis de qualidade das edificações e do espaço público, assim como pelas respectivas funcionalidades, o que assinala uma divisão econômica e social do espaço (DESE), nos termos colocados por Lipietz (1974). Divisão que, em alguns desses casos, vem negando a DESE preestabelecida, incitando uma nova convenção urbana, para empregar os termos utilizados por Abramo (1995). Para esse autor, a recuperação dos centros deve ser apreendida a partir do conceito de convenção urbana, compreendido como um dos mecanismos sociais mobilizados no processo de valorização-desvalorização do espaço urbano, caracterizado por articular interesses privados e públicos na redefinição dos valores patrimoniais urbanos. Abramo propõe haver, nas políticas de renovação dos centros históricos, uma estratégia de apresentálos como uma “inovação espacial” que, ao recuperar um patrimônio construído urbano, o vende como um novo produto urbano com repercussão no gradiente de preços fundiários e imobiliários da cidade.

No caso do Centro Histórico do Recife (CHR), manifestam-se duas frentes do mercado imobiliário. A primeira envolve os Bairros do Recife e de Santo Antônio, onde ocorreram intervenções urbanísticas de grande porte. Aí, o mercado habitacional foi sendo substituído pelo de comércio e serviços. O Bairro do Recife se torna um lugar excepcional para empresas de TIC e também, de turismo e lazer. O de Santo Antônio vem sendo ocupado por empresas do setor educacional. A segunda frente compreende os Bairros de São José e da Boa Vista, cujo mercado de locação continua ocupando um lugar privilegiado. Parte importante dos seus habitantes não tem situação financeira suficiente para promover a recuperação dos seus imóveis. A situação é agravada pela ausência da atuação do poder público, no que diz respeito a políticas de locação social e de requalificação dos espaços públicos. O resultado é a reprodução da espacialidade preexistente.

Quanto ao mercado de compra e venda de imóveis, no período de 2008-2013, dados do ITBI revelam que o volume de negociações foi menos expressivo nos Bairros do Recife, São José e Boa Vista, comparativamente à de Santo Antônio. Neste, a quantidade de transações foi significativa, destinadas a estabelecimentos de ensino superior. O baixo preço nele praticado denuncia o grau de deterioração das edificações e, também, a disposição de as empresas arcarem com os custos de recuperação, apostando na criação de um ambiente de geração de conhecimento. Sem o apoio do Estado, as firmas estão incitando uma nova convenção urbana e, com ela, uma nova espacialidade, refutando a DESE preestabelecida. Em contrapartida, os preços de compra e venda dos imóveis, nos Bairros da Boa Vista e de São José, não fazem senão reproduzir a espacialidade passada. O maior nível de valorização dos imóveis, no período em pauta, ocorreu no Bairro do Recife. Chegou a superar a valorização média do metro quadrado nacional dos produtos imobiliários habitacionais, financiados pelos bancos e também a média da Cidade do Recife. Nesse caso, o poder público tem exercido uma função essencial na recriação dessa espacialidade e, em extensão, na remuneração das vantagens locacionais monopolizadas.

Enfim, os preços praticados no CHR são o operador econômico da sua dinâmica espacial. Trata-se de operador sensível às ações do Estado e dos investidores privados, que recriam espacialidades, conferindo-lhes funções técnicas, destinadas a inseri-las mais fortemente no mundo globalizado. Ao mesmo tempo, esse operador é capaz de reiterar as espacialidades preexistentes, como heranças do passado.

O Centro Histórico de Belém (CHB) vem enfrentando um gradativo processo de declínio físico, manifesto na deterioração de edificações e espaços públicos. Tal fenômeno está relacionado, tanto ao abandono do local pelas moradias das classes de maior renda iniciado já na transição do Século XIX para o Século XX, quanto pelo deslocamento, para outras áreas da cidade, das atividades terciárias voltadas para estas camadas, intensificado, sobretudo, a partir da década de 1970.

Na tentativa de frear esse processo, as três esferas do Poder Público vêm realizando um variado conjunto de intervenções em prédios de importância histórica ou cultural e no próprio espaço público. O poder público também concedeu crédito subsidiado para a realização de obras e serviços de conservação em alguns imóveis privados de interesse histórico, além da isenção total e parcial de IPTU para as edificações mantidas em bom estado de conservação. Contudo, como ressaltam os levantamentos realizados, tais ações têm se mostrando insuficientes para reverter o declínio físico do CHB, para alterar de forma significativa o perfil de distribuição dos usos do solo e para promover qualquer processo mais consistente de gentrificação (salvo em áreas muito reduzidas).

A despeito disso, a área do CHB ainda se mantém bastante dinâmica em termos econômicos, sendo a principal centralidade de comércio e serviços da Região Metropolitana de Belém. Assim, não obstante o impacto da deterioração física, expresso, dentre outros, na tendência geral de declínio na média dos valores das transações de compra e venda realizadas no período de 2008 a 2013, o mercado imobiliário no CHB permanece bastante aquecido, tanto na área onde predominam os usos de comércio e serviços, quanto naquela majoritariamente habitacional; tanto na área mais voltada para o comércio regional ribeirinho, como naquela que concentra os estabelecimentos mais voltados ao comércio popular de cunho metropolitano. No período de 2008 a 2013, 14,5% dos endereços registrados no CHB foram transacionados, de acordo com dados do ITBI.

Em todos os segmentos do mercado imobiliário, o bairro da Campina registrou volume de transações muito maior que o da Cidade Velha, segmento espacial de ocupação mais antiga. Aumentou, também, a participação dos domicílios alugados no CHB, conforme os dados dos Censos do IBGE de 2000 e 2010, período em que a população da área cresceu numa taxa maior do que a do conjunto do município de Belém.

Quanto ao Centro Histórico de São Luís (CHSL), identifica-se uma tensão na sua dinâmica espacial. A desvalorização do uso residencial contrasta com a valorização do uso comercial, sempre muito bem valorizado. O abandono e a degradação convivem com os investimentos em reabilitação e, com eles, a promoção de novos usos. Observa-se que – como os centros históricos de Recife e de Belém – não há uma homogeneidade funcional. Há o centro comercial, que se mantém ainda como o mais importante; o centro turístico; o centro cultural e, ainda, o centro que abriga nichos residenciais que desafiam a “invenção” de novos modos de morar. Esses novos modos, por sua vez, precisaram, desde o primeiro momento, construir a ideia de inadequação do centro antigo como lugar de morar para promover a si próprios como ideais de bem viver. O abandono e a degradação de muitos dos imóveis do CHSL, consequência da valorização das novas espacialidades, tem penalizado o uso residencial, especialmente quando o mercado imobiliário de habitações novas cresce de forma vertiginosa, produzindo, condomínios fechados, de casas individuais ou apartamentos, incluindo os programas habitacionais do governo que adotam a mesma postura antiga de construir fora das áreas urbanizadas. Wall discute, portanto, a dinâmica espacial do CHSL – focando na tensão entre o abandono e a degradação, na permanência dos nichos residenciais e na valorização do uso comercial – e o processo de reabilitação urbana .

Finalmente, considerando a importância do mercado imobiliário de aluguel de moradias nos centros históricos, apresenta-se a evolução e o estado atual desse mercado no Brasil, vinculando a evolução demográfica à dinâmica do mercado de locação. Expõe o caso específico de São Paulo, mostrando que o imóvel de aluguel era a forma predominante de moradia até os anos 1970, diminuindo sensivelmente até os anos 2000. O locador paulistano, contrariamente ao imaginário, não é grande proprietário, com muitos imóveis de aluguel, mas sim pessoas de camada social próxima à do inquilino e frequentemente morador do mesmo bairro.

Exposição: Regulação da dinâmica espacial do Centro Histórico do Recife em tempo de globalização

Expositora: Norma Lacerda (UFPE)

Resumo: O recente processo de globalização da economia brasileira vem impulsionando uma nova dinâmica espacial no Centro Histórico do Recife (CRH). Este Centro, à conta de novos critérios locacionais de algumas atividades econômicas, tem conhecido, ao longo das duas últimas décadas, transformações espaciais em certas porções do seu território – as que vem internalizando uma série de externalidades – e, ao mesmo tempo, vem reproduzindo espacialidades preexistentes. Diante dessa realidade, o objetivo da apresentação é discutir a dinâmica espacial dos mercados imobiliários (compra e venda e aluguel) no CHR, com o intuito de verificar as suas diferenças e similitudes em áreas degradadas e em áreas em processo de requalificação. Mais precisamente, busca demonstrar como o mercado imobiliário nesse centro – mais especificamente os preços nele praticados – ora reproduz espacialidades preexistentes, reiterando estruturas predeterminadas (áreas degradadas), ora recria outras (áreas em processo de requalificação), conferindo a essas últimas funções técnico-econômicas, capazes de as inserir no processo de globalização da economia.

Exposição: Centros históricos no jogo da cidade caleidoscópica

Expositor: Pedro Abramo (UFRJ)

Resumo: Propomos discutir o mercado imobiliário em centros históricos a partir de dois eixos conceituais. Em trabalhos anteriores (Abramo, 2007), sugerimos o conceito de convenção urbana como um dos mecanismos sociais mobilizados no processo de valorização-desvalorização do espaço urbano. Em nossa apresentação vamos sugerir que os centros históricos vem sendo objeto da promoção de uma nova “convenção urbana” que articula interesses privados e públicos na redefinição dos valores patrimoniais urbanos. Dando seguimento à tese da convenção urbana propomos identificar nas políticas de renovação dos centros históricos uma estratégia de apresentar os centros históricos como uma “inovação espacial” que ao recuperar um patrimônio construído urbano o vende como um novo produto urbano com repercussão no gradiente de preços fundiários e imobiliários da cidade.

Exposição: Centro Histórico de Belém: degradação física e mercado imobiliário

Expositora: Helena Lúcia Zagury Tourinho (UNAMA)

Resumo: O Centro Histórico de Belém (CHB) vem experimentando um longo processo de deterioração física, que atinge tanto seu acervo arquitetônico quanto o espaço público. Para tentar reverter ou reduzir esse processo, o Poder Público realizou um variado conjunto de ações, com destaque para a recuperação ou requalificação de edificações de interesse à conservação e intervenções em grande escala no espaço público, além da concessão de crédito em condições favoráveis para recuperação de imóveis privados e isenção total ou parcial de IPTU para edificações mantidas em boas condições de conservação. Tais ações, contudo, tem se mostrado insuficientes para reverter o quadro de geral de deterioração da área. A despeito disso, as atividades econômicas situadas no CHB vêm mantendo um intenso dinamismo, estando voltadas, em sua quase totalidade, para o atendimento a uma clientela com perfil popular, o que tem sido reforçado pelo estabelecimento de um expressivo contingente de comerciantes chineses no local. Outra constatação relevante é que a população residente cresceu em taxa maior do que a do conjunto do município de Belém no período 2000-2010. Diante desse quadro, o objetivo da apresentação é discutir como o perfil do mercado imobiliário (compra e venda e aluguel) no CHB vem se comportando frente a esta dinâmica socioespacial, que se caracteriza por um quadro, aparentemente contraditório, marcado pelo dinamismo econômico e crescimento populacional aliado à deterioração física do estoque imobiliário e do espaço público.

Exposição: Centro Histórico de São Luís: tensões entre abandono, permanência e reabilitação

Expositora: Marluce Wall (UEMA)

Resumo: “Vende-se, aluga-se, troca-se, faz-se qualquer negócio” - a placa que anuncia o imóvel revela a tensão presente na dinâmica espacial no Centro Histórico de São Luís (CHSL), onde a desvalorização do uso residencial contrasta com a valorização do uso comercial. O abandono e a degradação convivem com investimentos em reabilitação e em promoção de novos usos. É possível observar que o centro não é homogêneo: há o centro comercial, que se mantém ainda como o mais importante; o centro turístico; o centro cultural e o centro que abriga nichos residenciais que desafiam a “invenção” de novos modos de morar, os quais, por sua vez, precisaram, desde o primeiro momento, construir a ideia de inadequação do centro antigo como lugar de morar para promover a si próprios como ideais de bem viver. O abandono e a degradação de muitos de seus imóveis, consequência da valorização das novas espacialidades, penaliza o uso residencial, especialmente em um momento em que o mercado imobiliário cresce de forma vertiginosa, produzindo, condomínios fechados, de casas individuais ou apartamentos, incluindo os programas habitacionais do governo que adotam a mesma postura antiga de construir fora das áreas urbanizadas. Nesta apresentação, discute-se a dinâmica espacial do CHSL,
focando na tensão entre o abandono/degradação, na permanência dos nichos residenciais, na valorização do uso comercial, bem como no processo de reabilitação urbana.

Exposição: Habitação de aluguel em São Paulo

Expositora: Suzana Pasternak (USP)

Resumo: O objetivo da apresentação é entender a evolução e o estado atual do mercado de aluguel de moradias nos pais, vinculando a evolução demográfica à dinâmica do mercado de locação. Visa contribuir também para a discussão sobre a importância da implantação de uma política de aluguel no Brasil. Para tanto, no primeiro item, analisa a evolução demográfica da população brasileira por grande região colocando algumas hipóteses de projeções populacionais. No segundo item, sobre habitação de aluguel no Brasil, mostra a evolução da proporção de domicílios alugados. Constata-se que a opção pela locação não diminui a renda das famílias, e que a habitação de aluguel não é de má qualidade, e é mais centralizada, densa e acessível. No terceiro item, onde se expõe o caso específico de São Paulo, verifica-se que o imóvel de aluguel era a forma predominante de moradia até os anos 1970, diminuindo sensivelmente até os anos 2000. O locador paulistano, contrariamente ao imaginário, não é grande proprietário, com muitos imóveis de aluguel, mas sim pessoas de camada social próxima à do inquilino e frequentemente morador do mesmo bairro.

Publicado
2019-05-21
Seção
Sessão Livre