SL6 Desenho, projeto e produção do Programa Minha Casa Minha Vida

  • Denise Morado Nascimento
  • Luciana da Silva Andrade
  • Lucia Zanin Shimbo
  • José Eduardo Baravelli
  • Luiz Amorim
Palavras-chave: desenho e projeto, minha casa minha vida

Resumo

SL-06. Desenho, projeto e produção do Programa Minha Casa Minha Vida

Coordenadora: Denise Morado Nascimento (UFMG)

Resumo:

No ano de 2009, em resposta à crise econômica mundial e à trajetória interna de demandas de consolidação de uma política de financiamento à habitação popular, o governo federal lançou o programa habitacional Minha Casa Minha Vida - PMCMV, com o objetivo de produzir um milhão de casas no país. Atualmente em sua segunda fase, o programa tem como meta a produção de mais dois milhões de unidades no território nacional. Recentemente, o governo federal ampliou essa meta em mais 350 mil unidades até 31 de julho de 2015.

Visando aquecer a economia nacional através de estímulos às atividades da construção civil no país, o PMCMV foi moldado para atender a promoção pública/privada habitacional em parceria com estados, municípios, empresas e entidades sem fins lucrativos.

Tal debate pressupõe uma reflexão sobre as relações institucionais e políticas entre esferas de governo, entre governo e construtoras e entre esses agentes e os beneficiários do referido programa. Sobre essa discussão, sobrepõem-se várias questões, dentre elas, a questão fundiária, que na prática consubstancia o nó central da questão habitacional no país, e em última instância, a produção de nossas cidades.

A proposta que ora se apresenta visa o debate entre pesquisadores engajados na pesquisa e na análise da produção habitacional de promoção pública e privada. Em razão da participação da EA/UFMG (Profa. Denise Morado), IAU/USP (Profa. Lucia Shimbo) e PROURB/UFRJ (Profa. Luciana Andrade) nas pesquisas desenvolvidas no âmbito do Edital MCTI/CNPq/MCIDADES N.11/2012, objetivamos criar no XVI Enanpur, ambiente de reflexão sobre o PMCMV em relação às suas condições de projeto e de produção, complementando-se temática e territorialmente. Cabe ressaltar que essas pesquisas fazem parte da Rede Cidade e Moradia, composta por onze instituições do norte, nordeste e sudeste do Brasil, todas reunidas a partir do mesmo edital, com outras duas propostas de sessões livres, complementares a que coordenaremos. Os temas em torno do Programa Minha Casa Minha Vida são Inserção urbana e Movimentos sociais, participação e trabalho social.

Nesse sentido, ampliamos essa sessão livre a outros dois participantes, Professores Luiz Amorim (UFPE) e José Eduardo Baravelli (FAU/USP) – cujos trabalhos também inserem-se na discussão proposta.

No processo de aprovação dos empreendimentos do PMCMV, o setor de Engenharia da CAIXA, responsável pela análise dos projetos, verifica o atendimento às regras estabelecidas pela instituição: (1) condições do projeto arquitetônico referentes à funcionalidade e segurança (acessibilidade, compartimentação, iluminação, ventilação); (2) avaliação do valor atribuído às unidades habitacionais; (3) orçamento da obra, com foco nos quantitativos de serviços e preços unitários; (4) análise do cronograma físico-financeiro. No que diz respeito ao projeto, vários itens são organizados pelos seguintes aspectos genericamente descritos: porte do empreendimento, terreno e localização, cota de implantação, taludes, desníveis e contenções, pé-direito, acessibilidade, privacidade, impermeabilidade, cobertura, sustentabilidade, estacionamento, segurança.

No que se refere aos espaços internos da habitação, as variações no tamanho e na tipologia – casa ou apartamento – resultam de uma mesma concepção geral baseada na prédeterminação do modo de morar, por sua vez ancorada em um perfil igualmente pré-determinado do grupo doméstico, a saber a família nuclear (pai, mãe e dois filhos). Eventuais alterações decorrentes de necessidades diversas frutos de novos arranjos familiares não são contempladas nestas unidades, concebidas como um conjunto fixo de compartimentos pré-definidos que irão abrigar funções também prédefinidas. No que se refere à família nuclear, indicadores recentes têm apontado para tendências de alterações importantes: não só o número de filhos tem diminuído, como tem aumentado o número de famílias com outros perfis, como por exemplo, as chefiadas por mulheres sem cônjuge. Há que se considerar ainda a existência de famílias ampliadas, compostas de membros com graus variados de parentesco e ligação: noras, genros, sobrinhos, netos, afilhados, pais, sogros, etc., assim como a existência de disparidades consideráveis entre as diversas regiões do país. Há que se considerar ainda a crescente tendência de trabalho autônomo na moradia, que requer outras concepções de espaço para além da simples reprodução cotidiana da família. Por todos esses motivos, um programa nacional de moradia que privilegie apenas um perfil de morador, ainda que estatisticamente majoritário, poderá incorrer em generalizações e distorções que não atenderão satisfatoriamente a todos os grupos a que se destina.

Outro aspecto importante para a análise diz respeito à consideração de parâmetros mínimos, explicitados como referência para o dimensionamento dos compartimentos e adoção de pés-direitos. No PMCMV os parâmetros mínimos tornam-se o limite máximo das unidades, uma vez que estas são entregues prontas e já acabadas. Estudos de casos e pesquisa direta com moradores deverão informar a análise dos impactos do programa sobre a vida cotidiana e os modos de morar. Do mesmo modo, serão avaliadas as tipologias arquitetônicas a partir da caracterização dos espaços internos das unidades e dos espaços externos dos empreendimentos produzidos.

Outra questão fundamental é compreender em que consiste o “mobiliário mínimo” usado como parâmetro dimensional dos recintos. Nenhum artefato é apenas uma referência dimensional: envolve padrões tecnológicos, culturais e econômicos nada negligenciáveis, inseridos em um sistema de produção por meio do qual a sociedade se faz reconhecer. O fato de alguns artefatos ou de alguns dos padrões que os conformam se imporem sobre os demais não é inócuo, trazendo inúmeras consequências, tão mais profundas quanto menos explicitadas: se um quarto é um espaço definido como aquele no qual cabe uma cama (ou duas), isto significa, por exemplo, que o uso de redes para dormir, bastante comum em determinadas regiões do país, é deslegitimado na medida em que não é acolhido como referência.

Igualmente, é importante analisar os espaços coletivos e suas relações com os demais espaços da cidade. Nas regras estabelecidas pela CEF para o PMCMV, não há diretrizes específicas em relação ao projeto do espaço público (ou comum), tanto no que diz respeito ao uso coletivo quanto ao dimensionamento, com exceção de dois aspectos: a) Terreno e localização - previsão de solução de atendimento por equipamentos e serviços comunitários usuais para empreendimentos habitacionais; b) Segurança - iluminação de áreas comuns. Os espaços públicos, como parte importante da esfera pública de qualquer sociedade, exigem para sua constituição plena a possibilidade de ação, liberdade de escolha, participação e engajamento. Assim, uma questão a ser explicitada é o impacto das regras de controle socioespacial (regras de convivência condominiais) frente as possibilidades de apropriação do espaço público, muito além dos espaços chamados comuns (escadas, corredores, etc.).

Por fim, vale destacar a priorização das dimensões tecnológicas e construtivas, que buscam maximizar os recursos financeiros aplicados na produção, nas próprias definições de projeto arquitetônico e urbanístico. Torna-se importante analisar a questão da produção no canteiro de obras e seu vínculo com o projeto da habitação. Para além dessas questões iniciais, as pesquisas a serem apresentadas partem do aspecto mais amplo, a inserção urbana dos empreendimentos, em seus impactos urbano-ambientais e socioespaciais, e, a partir daí, os pressupostos e os resultados dos parâmetros utilizados tanto na definição dos espaços das habitações como dos espaços externos. O espaço não é ocupado ao acaso, e a análise das mudanças nas dinâmicas que definem os padrões qualitativos e quantitativos desta ocupação é fundamental para o enfrentamento da questão habitacional brasileira, indissociada dos padrões gerais de nossa urbanização.

Para essa sessão livre, cinco contextos distintos se apresentam: Região Metropolitana de Belo Horizonte, Região Metropolitana de Rio de Janeiro, Região Metropolitana de São Paulo, Região Central de São Paulo e Região Metropolitana de Recife.

Exposição: O espaço projetado e o espaço apropriado no Programa Minha Casa Minha Vida

Expositora: Denise Morado Nascimento (UFMG)

Resumo: Consiste na descrição, análise crítica e proposições do PMCMV, referentes à pesquisa na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a partir de dois pontos de vista. O primeiro consiste na ação do programa que carrega, a priori, instrumentos (leis, cartilhas, manuais e modelos-padrão de projetos) e mecanismos próprios do modo de produção capitalista. Nesse sentido, a produção habitacional envolve instituições e agentes que produzem, reproduzem e disseminam o programa com acentuado grau de autonomia. A partir dessa ótica, o espaço é visto como o espaço projetado ou desenhado, precisamente calculado para o atendimento às normativas e à uma composição familiar média e padrão (pai, mãe e dois filhos). Aqui, as etapas do desenho e da execução dos empreendimentos e das unidades aparecem como etapas distintas e sequenciais que terminam com a entrega das chaves e o início da apropriação dos espaços pelos moradores. O segundo ponto de vista, a posteriori, inclui a ação dos moradores nesse processo da produção, via apropriação do espaço – seja pela adesão ou pela subversão. Inicialmente a metodologia de análise das escalas (empreendimento e unidade) e dos espaços é apresentada; na sequencia, a leitura realizada, aprofundando na descrição e análise conjunta e paralela dos dois momentos colocados acima para, ao fim, a apresentação de proposições.

Exposição: Para além da unidade habitacional: pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha] vida

Expositora: Luciana da Silva Andrade (UFRJ)

Resumo: Refere-se a um aprofundamento de questões de projeto arquitetônicourbanísticos identificadas em empreendimentos do PMCMV na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. O foco é no confronto entre os espaços criados pelos projetos com o perfil, as necessidades e as potencialidades dos moradores. A análise foi feita em três escalas. No que diz respeito ao bairro, foi analisada a qualidade física dos espaços públicos, identificando as condições dos percursos e permanências dos moradores para a realização de suas práticas cotidianas. Neste mesmo sentido, foi verificado em que medida a configuração espacial do empreendimento apresenta uma morfologia que permita sua integração com o bairro. No que diz respeito à moradia, o programa arquitetônico das unidades habitacionais foi confrontado com o número de integrantes, seu tipo de parentesco, a faixa etária e as atividades desenvolvidas pelos moradores. A metodologia para essa pesquisa envolveu o desenvolvimento de um projeto arquitetônico-urbanístico para uma das áreas de intervenção do PMCMV, o que permitiu dimensionar e qualificar a (in)adequação dos empreendimentos. Para isto, foi escolhido um dos complexos de empreendimentos dos cinco casos analisados em rede com o Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. Tanto a metodologia para a realização da pesquisa, quanto a de realização do projeto serão explicitadas, fundamentando as principais questões identificadas no processo de realização das análises.

Exposição: Projeto e produção do Programa Minha Casa Minha Vida na região central do estado de São Paulo

Expositora: Lucia Zanin Shimbo (USP)

Resumo: Trata-se de compreender os vínculos entre projeto e produção nos empreendimentos do PMCMV, na região central do estado de São Paulo. Parte-se da hipótese de que, num Programa em que a lógica imobiliária determina a sua operacionalização, as decisões de projeto arquitetônico e urbanístico são pautadas pela necessidade de se garantir o máximo desempenho dos recursos aplicados no processo de produção e a maximização do retorno financeiro. Dessa forma, os vínculos entre projeto arquitetônico e urbanístico, detalhamento técnico-construtivo e qualidade do projeto executivo ganham importância e se tornam absolutamente fundamentais numa produção em escala da habitação. Para verificar essa hipótese, foram promovidas duas abordagens de pesquisa. Na primeira, foi caracterizada a qualidade dos projetos urbanísticos e arquitetônicos, a partir de uma leitura e análise
da adequação das soluções dimensionais e espaciais dos projetos dos empreendimentos estudados e de uma avaliação dos principais instrumentos gráficos que orientam o processo construtivo. Na segunda, foi analisada a estrutura de produção mobilizada pelas empresas construtoras responsáveis pelos empreendimentos, desde os fornecedores de materiais até o trabalho no canteiro de obras. Nesse caso, foram adotadas estratégias de pesquisa qualitativa, sobretudo, entrevistas com técnicos e observação nos canteiros de obras, e pesquisa documental.

Exposição: Segregação urbana e desenvolvimento tecnológico no PMCMV

Expositor: José Eduardo Baravelli (USP)

Resumo: A apresentação discute a generalização dos sistemas de gestão de qualidade nos empreendimentos para baixa renda do PMCMV, cujos efeitos foram estudados em canteiros de obras de 10 empresas construtoras na região metropolitana de São Paulo. Nestes canteiros foi possível observar como a adesão obrigatória das empresas construtoras aos sistemas de qualidade SiAC, SiNAT e SiMAT, implantados pelo governo federal em continuidade com normas ISO/NBR 9001, reorganiza a cadeia produtiva da construção habitacional e eleva o controle sobre os serviços subempreitados. A introdução na produção habitacional para baixa renda de um modelo de industrialização baseado em tecnologia organizacional permite rever a leitura tradicional da moradia popular no Brasil pelo viés da manufatura e investigar novas implicações do subsídio habitacional no programa MCMV. As operações de repasse da unidade habitacional entre empresa construtora e agentes financiadores do programa são uma condição para implantação dos sistemas de qualidade em empreendimentos localizados em áreas periféricas na metrópole de São Paulo e antecedem sua replicação em empreendimentos de localização mais central, oferecidos com as linhas de subsídios do programa para rendas médias. O reforço aos ganhos de incorporação e à periferização dos empreendimentos para baixa renda indicam que segregação urbana e desenvolvimento tecnológico são fenômenos que se reforçam mutuamente no PMCMV.

Exposição: Programa minha cidade meu lugar

Expositor: Luiz Amorim (UFPE)

Resumo: O Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) representa, no Brasil, o renascimento mundial de ações públicas de promoção de habitação em larga escala. Diferentemente de experiências recentes, quando o Estado (BNH e COHABs estaduais) era o seu condutor, está voltado para a iniciativa privada como instrumento de política econômica, tendo em vista o papel da construção civil na economia nacional – empregabilidade, indústria e comércio de materiais, etc. Se o PMCMV tem atingido metas de provimento de moradia para os segmentos de média e baixa renda, repete equívocos quanto à periferização das cidades, promovida pela dinâmica do mercado fundiário – propriedades periféricas sem infraestrutura urbana são mais baratas e não oferecem grandes empecilhos normativos. O efeito não poderia ser mais perverso: o aumento da segregação sócio-espacial e a dissociação entre moradia e cidade. O MDU|UFPE e o Housing & Urbanism Programme|AA, promoveram duas oficinas internacionais (2013 e 2014) com o propósito de estudar alternativas de aplicação do PMCMV em zonas especiais de interesse social do Recife, como meio para minimizar a interferência do mercado fundiário e oportunidade para aplicar procedimentos de planejamento urbano devidamente integrados às escalas de governança e, fundamentalmente, à concepção de projetos habitacionais e urbanos vinculados aos modos de vida local. Neste sentido, foram desenvolvidas tipologias habitacionais relacionadas à mecanismos de intensificação urbana, no sentido de promover níveis de urbanidade satisfatórios. A apresentação objetiva avaliar as experiências acadêmicas e analisar em que medida os resultados obtidos foram absorvidos pelo Ministério das Cidades e a Prefeitura do Recife.

Publicado
2019-05-19
Seção
Sessão Livre