SL5 Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas:

cidades médias e consumo

  • Maria Encarnação Beltrão Sposito
  • Everaldo Santos Melazzo
  • Antônio Bernardes
  • Nécio Turra Neto
  • Eda Góes
  • Eliseu Savério Sposito
  • Marcio José Catelan
  • Maria Angélica de Oliveira Magrini
  • Igor Catalão
Palavras-chave: práticas espaciais, cidades médias, consumo, lógicas econômicas

Resumo

SL-05. Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades médias e consumo

Coordenadores: Maria Encarnação Beltrão Sposito (UNESP-PP) e Everaldo Santos Melazzo (UNESP-PP)

Resumo:

A proposta desta sessão livre é apresentar à comunidade acadêmica e debater, pela primeira vez em um evento nacional, alguns dos resultados já obtidos pelo desenvolvimento do projeto de pesquisa temático, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), intitulado “Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades médias e consumo”. Tal pesquisa é conduzida por pesquisadores do Grupo de Pesquisa Produção do Espaço e Redefinições Regionais (GAsPERR), alguns deles associados à Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe), pertencentes a quatro instituições universitárias: Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade Federal da Fronteira Sul (UFS) e Universidade Federal de Uberlândia (UFU). A esta pesquisa maior vêm se vinculando outros projetos como os resumos contidos nesta proposta mostram.

A pesquisa tem como eixo central estudar as relações entre reestruturação urbana e reestruturação da cidade, tomando-se como referência o consumo, que vem sendo analisado segundo três planos analíticos: 1) as NOVAS LÓGICAS DE LOCALIZAÇÃO DAS EMPRESAS, desenvolvidas como estratégias dos agentes econômicos, orientadas pela ampliação e pela diversificação do consumo e que geram NOVAS PRÁTICAS ESPACIAIS entre os que se apropriam do espaço urbano; 2) essas práticas, tanto quanto essas lógicas, redefinem o processo de estruturação urbana, promovem REESTRUTURAÇÃO URBANA e inserem as redes urbanas em escalas mais abrangentes, revelando uma divisão interurbana do trabalho mais complexa, bem como expressam vetores do processo mais amplo de mundialização da economia e de globalização dos valores; 3) elas reorientam o processo de estruturação dos espaços urbanos, podendo-se reconhecer uma REESTRUTURAÇÃO DAS CIDADES, expressando nova divisão econômica e social do espaço, que revela aprofundamento das desigualdades socioespaciais, tanto quanto reconstitui as diferenças socioespaciais, agora orientadas, sobretudo, pelas novas formas de consumo.

Esses três planos analíticos só ganham sentido em suas articulações, de modo a contemplar, na análise, as condicionantes subjetivas e objetivas, as dimensões sociais e econômicas. As práticas espaciais e as lógicas econômicas são tomadas, neste projeto, como possibilidades de se fazer a leitura das transformações urbanas e das cidades, sendo este o foco central da análise. O consumo é considerado como o meio a partir do qual as práticas e as lógicas podem ser apreendidas no período atual, razão pela qual ele foi eleito como importante para esta pesquisa, ainda que não seja o objeto de nossa investigação. Parte-se da ideia de que há, no geral, tendência de individualização da experiência e acentuação dos processos de diferenciação, no plano social e espacial, gerando novas formas de separação social que podem alcançar processos de segregação mais profundos e até de fragmentação socioespacial. Assim, os planos eleitos tomam como referência o esforço de estabelecermos percursos que possibilitem compreender as cidades médias a partir do consumo, tanto do ponto de vista da reestruturação dos espaços urbanos e das redes urbanas como das práticas de diferentes sujeitos sociais que são, ao mesmo tempo, expressão e condição das redefinições em curso.

O conjunto de mudanças em tela influencia as formas como as cidades se posicionam nas redes, tendo em vista que diferentes agentes econômicos e sujeitos sociais atuam, movimentam-se e tomam decisões, aumentando as articulações entre cidades da mesma rede e entre cidades de redes urbanas diferentes. Interessa-nos compreender como esse conjunto de mudanças nas formas de consumo e de produção para acentuar o consumo vem alterando a divisão interurbana do trabalho, possibilitando tornaremse mais complexos ou, ao menos, mais amplos os papéis das cidades médias, compreendidas como aquelas que desempenham papéis de intermediação no âmbito das redes urbanas das quais são constitutivas. Essas alterações serão compreendidas nesse projeto como um processo de “reestruturação urbana”.

Entretanto, as mudanças em curso não se operam apenas no que concerne à divisão interurbana do trabalho, uma vez que requerem redefinição nas lógicas de produção e apropriação dos espaços citadinos, ou seja, uma nova divisão econômica e social desses espaços, de modo a que eles estejam aptos a cumprir novos papéis e atender às demandas dos novos agentes econômicos, de um lado e, de outro, que os interesses relativos à propriedade privada e à produção imobiliária se realizem em novos patamares e gerem demandas de novos espaços de consumo e de habitação. Essas alterações, por sua vez, serão compreendidas nesse projeto como processo de “reestruturação das cidades”.

Muito embora seja ampla a bibliografia que trata das relações entre reestruturação econômica e reestruturação urbana, a nós interessa destacar o que é particular às cidades médias, observando como seu reposicionamento nas redes urbanas impõe, aos que nelas vivem e atuam, um conjunto de novas formas de interação espacial e, sobretudo, de novas práticas espaciais.

Assim, o que se pretende com este projeto de pesquisa não é o tratamento primordial da reestruturação econômica, mas sim estudar como a reestruturação urbana e das cidades médias resultam da dialética entre determinações objetivas e subjetivas, expressas nas práticas espaciais, o que requer considerar o econômico em suas relações com o social. Desse ponto de vista, os resultados que se esperam deste projeto não se restringem à compreensão das cidades médias estudadas, mas podem oferecer novos elementos para entender o conjunto da rede urbana brasileira, bem como novas dinâmicas que orientam o processo de urbanização e o movimento da sociedade.

A partir dos três planos analíticos citados, foram selecionadas quatro dimensões empíricas que vêm sendo desenvolvidas em seis cidades médias, sendo cinco no estado de São Paulo – São Carlos, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Marília e Presidente Prudente – e uma no estado do Paraná – Londrina:

1. RAMOS DE ATIVIDADES COMERCIAIS E DE SERVIÇOS relevantes para a compreensão das novas relações entre consumo, reestruturação urbana e reestruturação das cidades médias. Os dados e informações já obtidos têm permitido apreender e problematizara articulação entre escalas geográficas e as relações entre diferentes setores da economia, num período em que a ampliação das relações capitalistas atinge o âmbito supranacional, a partir da ação das empresas transnacionais.

2. FORMAS DE ORGANIZAÇÃO DA COMERCIALIZAÇÃO DE BENS E SERVIÇOS, representativas do período atual e que constituem mudanças nos meios de realização do consumo, considerando-se os processos de desconcentração e centralização espaciais que marcam as estratégias das empresas. Essa abordagem possibilita estudar a ação tanto dos grandes capitais (grupos econômicos e suas redes comerciais e de serviços) como dos médios (empresas vinculadas às franquias) e pequenos (comércio informal em suas articulações com outros capitais).

3. MEIOS QUE VÊM SENDO OFERECIDOS À CONSECUÇÃO DESSAS NOVAS FORMAS DE CONSUMO, de modo a avaliar como o crédito vem induzindo a ampliação dessas formas, tanto no que tange ao financiamento público da produção imobiliária, quanto no que se refere ao financiamento oferecido pelas próprias empresas comerciais, além daquele propiciado pela ampliação do uso do cartão de crédito.

4. Análise dos espaços que são decorrência das novas formas de consumo e, ao mesmo tempo, condição de sua realização, indicando a ocorrência de processos de reestruturação das cidades médias, observando a LOCALIZAÇÃO E OS CONTEÚDOS DOS NOVOS ESPAÇOS ONDE O CONSUMO SE REALIZA (com atenção especial aos shopping centers), bem como estudando quais ESPAÇOS SÃO OBJETO DOS NOVOS CONSUMOS (com atenção especial para os novos hábitats urbanos).

Do ponto de vista do método são quatro os fundamentos que norteiam as perspectivas da investigação: a) a relação quantidade-qualidade; b) a perspectiva temporal e a consideração de suas múltiplas temporalidades, em suas articulações com múltiplas espacialidades; c) a articulação entre escalas geográficas, e d) o par forma-processo. Por sua vez, os procedimentos e instrumentos metodológicos são vários, mas procuram guardar coerência entre si e com os elementos metodológicos: diferentes dados primários e secundários de natureza quantitativa, entrevistas, enquetes questionários, observações de campo etc. já foram capazes de prover um amplo conjunto de dados e informações sob análise. Por fim, a proposta é que, nesta sessão livre sejam apresentados os resultados já alcançados por alguns de seus pesquisadores, cujos resumos estão inseridos nesta proposta.

Exposição: Redes e rizomas: a internet e as dinâmicas da vida noturna em cidades médias

Expositores: Antônio Bernardes (UFF), Nécio Turra Neto (UNESP)

Resumo: As atividades de pesquisa desenvolvidas, concomitantemente, em dois projetos diretamente relacionados – Projeto temático FAPESP “Lógicas econômicas e práticas socioespaciais contemporâneas: Cidades médias e consumo” e pelo Projeto FAPERJ “Desenvolvimento de uma metodologia de pesquisa: centralidade urbana de lazer noturno e relações de interface” – têm possibilitado estudos acerca das
dinâmicas da vida noturna em cidades médias do Estado de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná e dos modos de consumo de grupos juvenis. Para cada cidade estudada consideramos dois âmbitos analíticos: a) o estudo de áreas centrais urbanas produzidas pela coesão de oferta de diversão noturna, em convergência com a infraestrutura das redes de telecomunicações – telefonia celular e internet – potencializando novas formas de sociabilidade; b) as dinâmicas de sociabilidade de grupos juvenis, seus modos de apropriação das áreas que exercem centralidade urbana em termos de vida noturna e as práticas de consumo que ali se realizam, bem como as interações sociais face a face e de interface – aquelas mediadas pelos meios de telecomunicações, notadamente, pela internet e suas redes sociais. Os estudos desses fenômenos têm exigido uma abordagem teórico-metodológica que congregue metodologias de pesquisa quantitativas e qualitativas, assim como pressupostos teóricos que possibilitem, de um lado, o estudo de sistemas técnicos correlacionados – redes – e, de outro, das relações sociais dos grupos juvenis, que cambiam sua estrutura – rizomas – para melhor se apropriarem do espaço urbano.

Exposição: Shopping center: consumo, simulação e controle social

Expositora: Eda Góes (UNESP)

Resumo: O consumo mudou de intensidade, conteúdo e status, conformando o mundo e se associando aos processos de diferenciação. Partindo desse pressuposto, mas sem desconsiderar problemas decorrentes, como a alienação e a fragmentação socioespacial, sobre a produção do espaço urbano entendemos que os shopping centers são espaços estratégicos para o entendimento desses processos nas cidades médias brasileiras, o que justifica a atenção especial a eles prevista na quarta dimensão empírica do Projeto Temático “Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades médias e consumo”, voltada à “análise dos espaços que são decorrência das novas formas de consumo e, ao mesmo tempo, condição de sua realização”. A perspectiva de análise é a do cotidiano, com foco nas práticas espaciais dos diferentes frequentadores de 13 shopping centers (consumidores, trabalhadores, representantes da administração e lojistas) pesquisados em seis cidades médias (Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São Carlos, São José do Rio Preto em São Paulo e Londrina no Paraná), em sua relação com a atuação dos agentes produtores desses empreendimentos. Isso implica em levar em conta as dimensões
simbólicas, tanto do consumo (conduta ativa e coletiva, sistema de valores, função de integração e de controle social), quanto desses espaços privados de acesso coletivo que são os shopping centers, supostamente convertidos em espaços públicos contemporâneos, processo que está diretamente relacionado à sua capacidade de exercer um férreo controle interno, sem deixar de proporcionar sensação de liberdade, em simulações cujos limites se evidenciaram nos “rolêzinhos” ocorridos na capital paulista em dezembro/2013 e janeiro/2014.

Exposição: Hierarquia/Heterarquia urbana e estratégias de localização das empresas. Os casos de Marília e Presidente Prudente

Expositores: Eliseu Savério Sposito (UNESP-PP), Marcio José Catelan (UNESP-PP)

Resumo: As estratégias de localização das empresas são definidas por meio de inúmeras variáveis. Os fatores de localização vão além das condições de mercado (consumidor e produtor), da presença da força de trabalho e das vias de circulação. Atualmente, a localização das empresas depende de outros fatores como a competitividade, seletividade, concentração espacial e demográfica, o que leva a diferentes tipos de cidades e de aglomerações urbanas. Todos esses fatores estão vinculados aos diferentes efeitos da globalização. Entre os aspectos apontados, a localização das empresas, considerando-se a escala de enfoque das cidades médias, ultrapassa os níveis da hierarquia urbana tradicional, apontando para uma heterarquia urbana que se consolida, subvertendo o modelo dos fluxos de cima para baixo por causa das tecnologias de informação e comunicação que interligam cidades em diferentes posições na rede urbana sem a intermediação das metrópoles. Deste modo, a partir das estratégias de localização das empresas, com foco nas cidades médias de Marília e Presidente Prudente, podemos constatar que há uma relação muito próxima entre o que se refere a padrões de estruturação em níveis na rede de cidades – a hierarquia urbana – e o que se refere a articulações em múltiplas escalas – a heterarquia urbana. Portanto, assumimos o par hierarquia-heterarquia como proposta metodológica de organização e articulação na rede urbana, tomando como exemplo empírico as grandes redes comerciais nacionais e estrangeiras.

Exposição: Fragmentação socioespacial e consumo: repensando o direito à cidade

Expositores: Maria Angélica de Oliveira Magrini (UFU), Igor Catalão (UFFS)

Resumo: No contexto da ampliação do acesso de diferentes segmentos sociais às práticas de consumo no Brasil, tornam-se necessárias reflexões acerca das permanências e/ou transformações dos sentidos e possibilidades de realização do direito à cidade. Partindo das análises realizadas em oito cidades médias brasileiras (Chapecó, SC; Ituiutaba, MG; Londrina, PR; Marília, SP; Presidente Prudente, SP; Ribeirão Preto, SP; São Carlos, SP; e São José do Rio Preto, SP), no âmbito de dois projetos de pesquisa vinculados: “Lógicas econômicas e práticas socioespaciais contemporâneas: cidades médias e consumo” (Temático FAPESP) e “Urbanização e fragmentação socioespacial em contextos não metropolitanos” (Universal CNPq), trabalhamos com a hipótese de que, na sociedade contemporânea, o consumo tem se constituído como antítese do direito à cidade, no sentido de que as escolhas locacionais dos agentes econômicos e as práticas espaciais dos citadinos, combinadas, tendem a reforçar o processo de fragmentação socioespacial, inclusive em contextos não metropolitanos. No âmbito deste processo, há uma propensão ao enfraquecimento das articulações que mantêm unidas as diferentes parcelas das cidades, a partir de lógicas de seleção, separação e evitamento ampliados, às vezes extremados em função dos contextos. Sendo assim, propomos uma discussão sobre as relações entre direito à cidade e fragmentação socioespacial, ancorados no consumo como mediador da análise e pautados numa abordagem qualitativa que considera as práticas espaciais quotidianas dos citadinos e suas representações acerca delas.

Publicado
2019-05-19
Seção
Sessão Livre