SL2 Políticas de desenvolvimento urbano baseadas na mobilidade urbana e inclusão sócio-territorial:

Reflexões a partir das propostas de São Paulo

  • Eduardo Alberto Cusce Nobre
  • Renato Nunes Balbim
  • Carolina Heldt D´Almeida
  • Armando Palermo Funari
  • Luís Maurício de Martins Borges
  • Pedro do Carmo Baumgratz de Paula
  • Patrícia Cezário Silva
  • Lígia Pinheiro de Jesus
Palavras-chave: desenvolvimento urbano, mobilidade urbana, inclusão sócio-territorial

Resumo

SL-02. Políticas de desenvolvimento urbano baseadas na mobilidade urbana e inclusão sócio-territorial: Reflexões a partir das propostas de São Paulo

Coordenadores: Eduardo Alberto Cusce Nobre (USP), Renato Nunes Balbim (IPEA) e Carolina Heldt D´Almeida (Prefeitura Municipal de São Paulo).

Resumo:

Apesar do surgimento planejamento urbano no Brasil datar de meados do Século XX, a análise dos dados básicos do padrão de urbanização brasileiro comprova que as nossas metrópoles se conformaram como territórios da desigualdade sócio-espacial. Segundo dados da Fundação João Pinheiro, o déficit habitacional no Brasil em 2010 era de 6,5 milhões de unidades, concentrando-se principalmente nas regiões metropolitanas, nas faixas de renda de até dois salários mínimos, correspondendo a 45% do total do déficit.

Um terço do total dos domicílios urbanos permanentes do País, 10,2 milhões de moradias, carece de, pelo menos, um dos serviços públicos – abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta de lixo e energia elétrica. Em relação ao adensamento demográfico estima-se que 2,8 milhões de domicílios urbanos contabilizem mais de três moradores por cômodo da habitação. Com relação ao padrão construtivo, pelo menos 840 mil moradias edificadas são carentes de reforma e readequação. Já com referência à irregularidade fundiária na posse de terrenos e moradias estima-se que ela atinja cerca de 2,2 milhões dos domicílios urbanos.

Outra questão premente é a da mobilidade urbana. Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em parceria com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), quantificou as perdas advindas do congestionamento de trânsito ocasionados pela matriz de transportes adotadas em nossas cidades, resultando em perdas econômica da ordem de 2% do PIB ao ano, resultando em 506 milhões de horas perdidas por ano, 258 milhões de litros de combustível, 123 mil toneladas de monóxido de carbono, 11 mil toneladas de hidrocarbonetos em 10 metrópoles brasileiras.

Além das questões de desvinculação das políticas de regulação do uso do solo e os sistemas de transporte, existe a opção política e ideológica de concentração dos investimentos públicos no transporte individual sobre pneus. Apesar dos veículos particulares representarem somente 19% dos deslocamentos nas cidades brasileiras, eles consomem cerca de 70% de suas vias Enquanto isso, apenas 8% dos passageiros de transportes coletivo são transportados diariamente pelos sistemas metroferroviários.

Esses dados corroboram a averiguação do padrão de urbanização brasileiro de concentração de investimentos e da infraestrutura nas áreas centrais de nossas metrópoles, apropriadas pela população de alta renda, enquanto que grande parte da população de baixa renda é expulsa para as regiões periféricas.

Algumas cidades vêm tentando reverter esse processo, procurando incentivar a implantação de sistemas de transporte coletivo de média e alta capacidade, vinculadas à regulação de uso e ocupação do solo que procure promover o adensamento ao longo dessas áreas com diversidade social e ambiental.

Uma das propostas recentes nesse sentido está contida no novo Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (São Paulo, 2014). Com os objetivos de: incentivar o adensamento com diversidade funcional e social das áreas subutilizadas no entorno da rede de transporte coletivo de alta e média capacidade, conter a expansão horizontal, garantir o acesso à terra para a população excluída, reduzir os tempos de deslocamento e as desigualdades sócio-territoriais; esse plano adotou como um dos principais elementos de ordenação territorial da cidade a Rede dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana.

Baseado no conceito do TOD – Transport Oriented Development, esses eixos são definidos como as áreas de influência da rede estrutural de transportes coletivos potencialmente aptas ao adensamento construtivo, populacional e de uso misto entre usos residenciais e não residenciais.

De acordo com o plano, entre os objetivos de estruturação dos eixos estão: a qualificação urbanística dos espaços públicos; a mudança dos padrões construtivos e ampliação da oferta de serviços e equipamentos públicos; ampliação da oferta de habitações de interesse social na proximidade do sistema estrutural de transporte coletivo.

A fim de estabelecer diretrizes para formulação de um programa de implementação dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, foi adotado o método de trabalho da Matriz do Modelo Lógico, metodologia para formulação de programas de políticas públicas e avaliação de resultados desenvolvida pelo (IPEA, 2010).

O Modelo tem com papel principal explicitar a “teoria” da intervenção, fazendo uso de representação gráfica para identificar o problema. Compõe o modelo: Árvore de Problemas e suas causas crítica e consequências; Matriz do Modelo Lógico, forma de estruturação do projeto para alcance dos resultados; Referências Básicas, com os descritores da situação inicial, do problema, do objetivo geral e dos objetivos específicos; e os Fatores Relevantes de Contexto, que terão influência sobre o projeto. O uso da metodologia traz a tona o entendimento do programa e da política pública em elaboração pelo município, orientando e organizando o conjunto de pesquisas especificas desenvolvida à luz do problema de “subaproveitamento dos sistemas de transporte como estruturantes do espaço urbano dificultando o acesso à infraestrutura, bens e serviços para todos”.

A partir da aplicação dessa metodologia, foram desenvolvidos trabalhos prospectivos, procurando compreender como que a aplicação desse novo plano diretor poderá contribuir para reverter ou não esse processo histórico de estruturação da cidade.

O primeiro trabalho tem como objetivo a investigação a cerca da contribuição do imposto territorial urbano, enquanto sistema orientado à universalização de equipamentos públicos no território e da integração da política fiscal do município de São Paulo com o padrão socioeconômico das subprefeituras, enquanto referência para diagnóstico, planejamento e acompanhamento da política de infraestrutura pública.

O segundo investiga o aprofundamento da concentração de dinâmicas econômicas e de infraestruturas no vetor de expansão do Sudoeste, dificultando o cumprimento dos objetivos de redução das desigualdades sócio-espaciais e de ampliação do acesso à cidade pelas diferentes classes sociais, em especial no que diz respeito à atuação através dos incentivos de uso e ocupação do solo ao longo dos Eixos.

O terceiro tem como objetivo a avaliação às alternativas institucionais aos obstáculos jurídicos e financeiros à aquisição de terras para os projetos integrados dos Eixos, analisando os procedimentos administrativos e judiciais de desapropriação e o modelo de transferência de potencial construtivo (TPC) como formas de aquisição de terras.

O quarto procura compreender os limites e as possibilidades da aplicação do instrumento urbanístico “cota de solidariedade” na promoção de um território socialmente mais justo e menos segregado, principalmente na aquisição de terras para a produção de unidades de habitação de interesse social ao longo dos Eixos.

O quinto tem como objetivo avaliar em que medida o Projeto de Intervenção Urbana (PIU), previsto no PDE, pode ser um instrumento estratégico para a integração das políticas de implantação dos Eixos e, quais os possíveis avanços, em termos da constituição técnica e de desenho institucional do instrumento poderiam resultar em benefícios para essa implantação.


Esse trabalho foi financiado pelo IPEA e SMDU no âmbito do Convênio 01/2013 IPEA-SMDU/PMSP.

Exposição: Padrão de concentração de estruturas e perspectivas para intervenção urbana através dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana de São Paulo

Expositor: Armando Palermo Funari (UNICAMP)

Resumo: A busca por uma cidade mais acessível e democrática passa pela sofisticação dos instrumentos de incentivo e desincentivo usualmente calcados sobre a produção imobiliária, de caráter extremamente concentrado (espacial, econômica e socialmente). O trabalho aborda possíveis gargalos a serem considerados na persecução dos objetivos do recentemente aprovado Plano Diretor da cidade de São Paulo no tocante ao enfrentamento da desigualdade socioespacial no município e seus impactos sobre o acesso à cidade a partir da investigação do padrão de concentração de moradias, emprego, produção imobiliária e gastos públicos nas suas diferentes regiões entre 2000 e 2010. Aproveitando-se de metodologia similar à empregada por Villaça (2001), a análise investiga o aprofundamento da concentração de dinâmicas e estruturas no vetor de expansão do Sudoeste, o que coloca desafios adicionais ao cumprimento dos objetivos de redução das desigualdades socioespaciais e ampliação do acesso à cidade pelas diferentes classes sociais, em especial no que diz respeito à atuação através dos incentivos de Coeficiente de Aproveitamento do instrumento dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana do PDE.

Exposição: Integração da política fiscal orientada à universalização do direito à cidade

Expositor: Luís Maurício de Martins Borges (UNICAMP)

Resumo: O objetivo da investigação é colaborar para a integração da política fiscal do município de São Paulo, incorporando o padrão socioeconômico das subprefeituras, enquanto referência para diagnóstico, planejamento e acompanhamento da política de infraestrutura pública e de contribuição do imposto territorial urbano, constituindo um sistema orientado à universalização de equipamentos públicos no território. A referência teórica do método de análise baseiase na apreensão das múltiplas determinações, como uma unidade do diverso e o seu resultado. Neste caminho, estabelecem-se como as relações determinantes mais gerais da produção e valorização da riqueza urbana da cidade (sem considerar os aspectos
macroeconômicos) as condições: i) das famílias; ii) da infraestrutura; e iii) da dinâmica da produção imobiliária; para a reflexão sobre iv) a ação do setor público municipal; e v) a proposição de um padrão mais substancial de financiamento da política urbana, frente aos desafios da cidade. A inovação da pesquisa está em: i) sair da referência da determinação dos preços do imóvel, como referência exclusiva do IPTU, para se conectar as relações e condições de valorização imobiliária nas vizinhanças, sob as expectativas e condições das famílias referentes à moradia, trabalho e acesso a infraestrutura e serviços públicos na cidade, e mesmo da lucratividade das empresas e rentabilidade para os proprietários; e ii) a reflexão sobre um sistema de planejamento da ação pública que estreite a apresentação, debate e justificação no que se refere à política de tributos e despesas públicas.

Exposição: Alternativas institucionais para a implementação dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana em São Paulo

Expositor: Pedro do Carmo Baumgratz de Paula (USP)

Resumo: Quais são os principais desafios para a implantação dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana (Eixos) em São Paulo? De acordo com o Secretário Municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Melo Franco, esses se resumem a: regulação, barreiras jurídico-institucionais e financiamento. No entanto, um aspecto do financiamento dos Eixos que é crítico para a atual gestão é a aquisição de terras. Dessa forma, o objetivo desta pesquisa é avaliar as alternativas institucionais aos obstáculos jurídicos e financeiros à aquisição de terras para os projetos integrados dos Eixos em São Paulo. O escopo específico da pesquisa restringe-se a avaliar e propor alternativas aos procedimentos administrativos e judiciais de desapropriação e ao modelo de transferência de potencial construtivo (TPC) como formas de aquisição de terras nos Eixos proposto no PDE/2014. A metodologia adotada consiste na análise de ambientes e arranjos institucionais (GOMIDE e PIRES, 2014) a partir de uma descrição interna, mapeamento externo (experiências nacionais e internacionais) e avaliação das possibilidades de adaptações institucionais locais, levando-se em consideração o contexto e as potencialidades do arcabouço institucional local (noção de “Scan globally, reinvent locally”, conforme Stiglitz, 1999). Ao final, pretende-se propor desenhos institucionais capazes de favorecer aprendizado institucional e, assim, promover os resultados esperados pela política em questão (política de transformação urbana conformada pelo PDE/2014).

Exposição: Ensaio sobre o potencial de produção de habitação de interesse social por meio da aplicação da cota de solidariedade na Cidade de São Paulo

Expositora: Patrícia Cezário Silva (USP)

Resumo: A aplicação inovadora de instrumentos urbanísticos na implantação dos eixos de estruturação da transformação urbana guia a investigação de dois temas fundamentais da política urbana em São Paulo: a aquisição de terras pela municipalidade e a produção de habitação de interesse social - HIS. A Cota de Solidariedade tem um potencial transformador da segregação sócio-espacial, especialmente pela vinculação da construção de grandes empreendimentos à destinação de habitação de interesse social em localizações que permitem amplo acesso à rede urbana de empregos, infraestrutura e serviços. Essa é uma das quatro possiblidades de aplicação da Cota, à escolha do empreendedor. Outra alternativa é a doação de terrenos pelo empreendedor ao município, na proporção de 10% da área do terreno gerador da cota. A abrangência desse instrumento é pequena, pouco mais de 2% da produção imobiliária, se tomarmos como exemplo o lançado entre 2000 e 2010. Além disso, as duas alternativas de aplicação do instrumento apresentadas acima tendem a ser preteridas se comparadas à doação de 10% do valor do terreno ao FUNDURB ou produção de 10% da área computável em HIS em outra localidade. Com isso, o potencial de modificação da estrutura urbana altamente segregada ficará comprometida.

Exposição: O projeto de intervenção urbana como articulador das políticas públicas para implantação dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana

Expositora: Lígia Pinheiro de Jesus (USP)

Resumo: Os Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, definidos pelo novo Plano Diretor de São Paulo como as áreas de influência do sistema estrutural de transporte coletivo de média e alta capacidade, são porções do território municipal onde se prevê um processo de transformação do uso do solo, com o adensamento populacional e construtivo articulado a uma qualificação urbanística dos espaços públicos, mudança dos padrões construtivos e ampliação da oferta de serviços, equipamentos público e habitação de interesse social. Entretanto, um dos grandes desafios para a implementação dos Eixos é a articulação das políticas públicas. O objetivo da pesquisa é avaliar em que medida o Projeto de Intervenção Urbana (PIU), previsto no PDE, pode ser um instrumento estratégico para a integração das políticas de implantação dos Eixos e, quais os possíveis avanços, em termos da constituição técnica e de desenho institucional do instrumento poderiam resultar em benefícios para a implantação dos Eixos. Com base na analise dos mecanismos desse instrumento e na crítica de outras experiências já efetivadas no âmbito da Prefeitura Municipal de São Paulo, fica evidenciado que não basta o arcabouço técnico e legal atribuídos ao Projeto de Intervenção Urbana (PIU) pelo Plano Diretor Estratégico para que se faça cumprir sua finalidade. É preciso o desenvolvimento de mecanismos técnicos e institucionais específicos para que o instrumento crie condições efetivas para o desenvolvimento de projetos integrados para os Eixos.

Publicado
2019-05-19
Seção
Sessão Livre